Fernando Pessoa, chamou, por diversas vezes, a atenção para
a língua portuguesa... sendo até misterioso nalgumas ocasiões no modo como o
fazia. O seu poder de síntese (daí ser poeta e de a sua prosa,nos aparecer de
alguma forma, como parte dos “bastidores” da poesia...) conduzia-o a frase
lapidares. Ora, as frases lapidares contêm o mistério dos mortos, encerram em
si toda uma vida e daí que haja lápides funerárias com inscrições que apelam ao
“decifrar” de um passado que assim não fica totalmente enterrado na
amnésia... Dei com este excerto precioso de J. A. Alves Ambrósio, no qual,
parte da frase lapidar de Fernando Pessoa é explicado, revelado. Será apenas
parte dessa frase que aqui mostra a sua face luminosa, é verdade, mas não deixa
de ser importante chamar a atenção para estes detalhes tão brilhantemente
expostos por este autor, publicados no número 14 da revista Nova Águia, pág. 94 e que contêm em
si, o germe, de toda uma relação que se pode ter com uma língua, como coisa viva e não apenas utilitária:
“Se os filhos – ainda que nos mais tenros anos –
pronunciassem mal uma palavra ou dessem um “pontapé na gramática”, qualquer dos
progenitores, nascidos ambos na segunda década do século passado – e o Pai tinha apenas a 3ª classe e a Mãe a 4ª –, os emendava prontamente.” (...)
"As consequências, na sua lucidez, eram inexoráveis: pensar antes de falar e/ou escrever; a busca do termo adequado (no fundo há matizes não sinónimos); a peculiaridade inerente a cada idioma; a etimologia e a semântica; vários dicionários ao lado; uma raiz, uma génese, e concreções linguísticas diversas, resultado de diversas idiossincrasias; um espantoso alargamento do campo de consciência; a transposição da linguagem, do falar, para o estudo, a escrita e a relacionalidade, v.g.; uma total exigência para a Vida, na Vida; uma prospectiva perspicácia na identificação e comunicação do/com o outro; uma coadjuvância para, desde logo, a captação psicológica do interlocutor e/ou de um auditório para o qual tenha que falar-se; a exponenciação da intuição; o sentir-se cada vez mais seguro interiormente; a indefectível curiosidade; o amor pelo estudo; o sentimento de que quanto mais dificuldades mais vitórias; a elevação da genuína poesia (Camões, Correia Garção, Pessoa, Torga…) e prosa (Vergílio Ferreira entre os contemporâneos); a intangibilidade da Hierarquia e da Tradição (o “medir as distâncias”, como, reiteradamente ou- via dizer ao Pai), etc., etc., etc. Da opulência de resultados, é instante salientar alguns tópicos: o conhecimento de si mesmo; o intangível respeito pelas raízes e pela semântica; o vivo sentido da evolução; o conhecimento do Passado; a incoercível implicação da linguagem – para não me alongar. Com efeito, é absoluta- mente instante lembrar – sempre – que o conhecimento de si mesmo é o ponto de partida de toda a única – e verdadeira – Filosofia; e que a linguagem implica o pensamento – e esta asserção, parece-me, é mais verdadeira que a inversa. (...)
Por outro lado, quando me tornei um cosmopolita, notei – concluí, claro – com absolutas força, consciência, que, por trás, no fundo, de cada idioma o que se situa é uma irredutível, incoercível, espiritualidade.”
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