sexta-feira, 20 de maio de 2022

As três taças

 


Dizia hoje uma professora: "O que quer que façamos, ninguém liga. É frustrante." Estive mesmo para lhe contar a história da minha vida, bem resumida na frase dela. Isto por um lado e, por outro, estive mesmo para lhe dizer que o aval dos outros não interessa nem ao menino Jesus. Não optei por nenhuma das hipóteses de comunicação. Fiquei calada envolvida no silêncio trágico a que somos votados nesta época que tem o poder de aniquilar aquilo que importa. Comprei três taças bonitas e olhei-as demoradamente. Valem mais do que frases idiotas como mais esta na antestreia da publicação da biografia de Fernando Pessoa: "O homem que decidiu ser um génio". Está visto que não foram lidas as palavras de Fernando Pessoa: "a alguns a grandeza é-lhes imposta". Estes disparates introdutórios, ditos a propósito da publicação em Português da biografia do poeta, levam-me a olhar com relutância para a mesma que já se encontra cá em casa. Hei-de pegar nela com coragem, não pelo tamanho, mas pelo risco que corre um americano a ponderar sobre Fernando Pessoa, por outro lado, terei de dizer a mim própria que sendo americano, tem desculpa porque ser português é outra coisa... Sê-lo efetivamente,  é conseguirmo-nos mover pelo elemento pesado e denso composto pela substância e pela essência. Não sei se Zenith já percebeu isso, mas penso que não. E hoje, ser português é conseguirmos elevar e levar o mundo nos braços, atravessando-o em simultâneo de ponta a ponta num ténue fio de seda, passo a passo, sem o deixar cair nem nos deixarmos cair a nós mesmos. E esse é um acto profundamente solitário com os olhos postos no céu. E por isso, se queixa a professora do que quer que faça, ninguém liga. Pois não. Essa é a condição de todos nós, sem excepção. Não fosse a Luz, e seria realmente assim...

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