Na verdade sou uma cápsula do tempo onde guardo o tempo selectivo. Dizem que a memória é selectiva, coisa que não sei nem me interessa. Na verdade, o tempo é muito mais interessante até porque não existe ou existe sempre todo ao mesmo tempo. Depois, vem a vanguarda do que sou, eterna suicida de si própria, onde por pequenos pontos de luz, espreita o tempo que escolhi. E o outro que há, não é escolha minha é o do futuro que me engole e onde não há espaço para a saudade porque os seres, os tempos e a luz não a justificam mais. É o tempo selectivo do futuro. Embrenho-me por essa floresta sem que ela tenha um aspecto assustador. Uma apaziguada verdura, uma cascata cristalina, o sol dourado por entre as árvores. O mar brilhando no terraço da minha alma. Ninguém suspeita desses recortes do tempo. Quando passo vou disfarçada do contemporâneo e facilmente entro nos locais da moda e me sento e peço um capuccino. E cruzo as pernas enquanto aventuro o garfo no bolo de frutos vermelhos feito com produtos biológicos. Nesse instante, estou na moda. No Chiado. No último café que abriu. E o meu baton sorri. Mas espio tudo. Abro a mala e só tenho tempo lá dentro. Tempos incríveis. Palácios antigos, aldeias de inverno com tripés abrasados pelas horas ao lume, lenços dos namorados originais, pombas do Espírito Santo soltas em alto mar... Na minha mala trago todas as aventuras do passado e essa quietude do paraíso onde as aves cantam e o nosso corpo feito de flores. O contemporâneo só serve para espiar, não para guardar.
Bebi
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