sábado, 22 de agosto de 2020
A mística do movimento dos quadros
Esta nova moda de decoração que consiste em não pendurar os quadros na parede, mas sim, em encostá-los à parede, quer no chão, quer em cima de um aparador ou de uma mesa deve ter sido inventada por um decorador que gostaria de ser pintor. Como sou uma pintora que gostaria de ser decoradora, passo a explicar (e não, não é andar de cavalo para burro por razões estritamente esotéricas de muito complicada explicação, a sério): os pobres pintores pintam sempre mais do que o espaço que dispõem para pendurar os quadros e, por causa disso, frequentemente encostam os quadros à parede. Outras vezes, estão a meio da pintura e fazem o mesmo. Quando acabam, gostam que alguém os coloque na parede. O decorador da nova moda achou por bem colocar quadros ou fotografias emolduradas no chão e encostá-los à parede o que é meio caminho andado para um piparote a meio da noite a caminho da casa de banho e, se estiverem em cima do aparador, é meio caminho andado para a empregada (as pessoas que contratam decoradores têm sempre empregada) lhes dar um piparote também e de estes virem a estatelar-se no meio do chão. Estas coisas irritam-me. São parvas demais. Por outro lado, onde é que fica a mística do movimento súbito dos quadros? Quando eles, de um momento para o outro, caem do prego onde estão pendurados e assustam todas as pessoas e obrigando-as (finalmente) a verem o quadro ou a pensarem que é alguma coisa de sobrenatural que se está a passar (as vezes é, outras não). Há modas tão parvas mas tão parvas que só conseguem causar tiques de novo-riquismo misturado com os tiques de uma elite que se pensa ser intelectual a quem as segue. Vejam lá onde colocam os pés e digam à empregada que vai limpar o pó, que o facto do quadro estar encostado à parede é muito "in". Tenho a certeza que ela vai compreender. E, já agora, cuidado com o aspirador, não vá um dia vir a marrar no quadro qual touro enraivecido. E com razão.
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