quarta-feira, 31 de março de 2021
A Dama da noite
segunda-feira, 29 de março de 2021
Comentário ao texto "Os Novos Teratomas: uma análise do paganismo reconstruído à luz do pensamento de René Guénon"
Como é que Gilberto Lascariz, um forte opositor das religiões abraâmicas, continua a utilizar termos como Tradição Pagã ou Intuição Gnóstica? Tanto o termo “paganismo” como o “Gnosticismo” foram utilizados pelos cristãos. As paelhas de termos e de conceitos, misturam-se alegremente e quem não está preparado pela leitura atenta da obra de René Guénon (que é um todo e não apenas os livros traduzidos para português), espalha-se ao comprido ao interpretar o texto de Lascariz, “Os Novos Teratomas: uma análise do paganismo reconstruído à luz do pensamento de René Guénon”, apresentado no seu bloque pessoal (http://www.gilbertolascariz.com). No entanto, é bom saber que Lascariz se interessou pela “Crise do Mundo Moderno”, obra de René Guénon. Se ler toda a obra, terá surpresas, sobretudo se largar definitivamente termos como “pagão” ou “gnose” que, nos dias que correm (e já antes dos dias que correm), dão origem a uma enorme confusão, isto se o intuito de Lascariz for mesmo o de alertar para o “politicamente correcto”, para o “multiculturalismo” e para os movimentos das minorias marginais das políticas pós-marxistas. Termos como “paganismo” ou “gnosticismo”, pela confusão que suscitam, são um manjar, não dos deuses, mas dos homens. Para quem é politicamente correcto na sua defesa do multiculturalismo e dos movimentos das minorias marginais das políticas pós-marxistas o termo “paganismo”, serve o multiculturalismo e o termo “gnosticismo” serve o politicamente correcto, vejamos, por exemplo, a ideia cristã segundo a qual há uma transição em qualidade, um melhoramento, uma evolução, do Antigo para o Novo Testamento. Este é o exemplo máximo daquilo a que chamo os “ditadores tolerantes”, uma tolerância que esconde a pior das intolerâncias, a tal agressividade passiva com base na ideia de que houve acesso a mais conhecimento, tão gnóstica… esta ideia. Mas o termo “gnóstico”, provindo do grego, remete para alguém ou para algo capaz de conhecer e daí que dê para tudo. Serve a todos, outra coisa não se espera numa época sem elite. Bem vistas as coisas, qualquer pessoa pode ser capaz de conhecer, mas poucas abandonaram o termo gnóstico, porque quando isso acontece, então sim, temos elite. Poderei dizer que este texto de Lascariz é uma leitura com duas lentes sobrepostas: uma, à luz do pensamento de René Guénon e outra, à luz de termos induzidos pelo cristianismo quando utiliza termos de substituição pelos termos de Guénon. Creio que não são necessárias tantas dioptrias, uma basta. Também a mim já me aconteceu perder uma dioptria. Literalmente. E agora vejo melhor.
terça-feira, 23 de março de 2021
A Saúde Mental
Se os portugueses se sentissem calmos, tranquilos e alegres com a pandemia e o distanciamento social, aí sim, estariam com problemas de saúde mental. A isto chama-se "inversão das coisas". Neste Carnaval sem fim à vista, já ninguém repara neste tipo de informação cujo objectivo é fazer crer que aquilo que é absolutamente normal é uma anormalidade e vice-versa.
sábado, 20 de março de 2021
Os elefantes
quinta-feira, 18 de março de 2021
Rui Rio, ris de quê?
O problema de alguns maçons saírem da linha não é um problema dos partidos políticos, é um problema da Maçonaria. O espírito está acima da matéria. Desta feita, não há razão nenhuma para a tal "transparência" (hilariante) que quer publicitar quem é ou não maçon. Antes de prestar contas a um partido, um maçon presta contas a si próprio e à Maçonaria que teoricamente deveria fazer parte dele (prestando contas a si próprio está instantaneamente a prestar contas à organização a que pertence), assim, só mesmo da cabeça de um profano vir querer inverter as coisas e colocar a política (matéria) acima do espírito. O problema da Maçonaria não punir os malfeitores no seu seio é um problema intrínseco à própria sociedade secreta. Relativamente à Opus Dei, o espírito não está presente, nem em semente (virtualidade) nem em crescimento (porque é sempre insustentável como qualquer fanatismo o é) e, por isso, a revelação de quem pertence ou não à Opus Dei, em última instância, torna-se pertinente apenas para a medicina tanto no campo da psiquiatria como no campo da medicina geral (parece que se auto-flagelam) e, em gravidade superior, em último caso, torna-se pertinente a nível jurídico (quando o fanatismo se permite esbarrar com a lei), tudo muito materialista, portanto. Posto isto, Rui, vá estudar.
A cigana, D. Jekyll e Mr. Hyde
Vi uma fotografia antiga de uma cigana que ainda era miúda no início do século XX. Tinha chegado aos 100 anos. Nessa fotografia, aparecia descalça e suja, rodeada de terra e sabe-se lá o que mais. Ainda há muito poucos anos, os suecos, quando vinham a Portugal e bebiam a nossa água, ficavam mal da barriga e nós, em simultâneo, ao beber a água da torneira marroquina, ficávamos iguais aos suecos, agarrados à barriga. A cada povo, seu sistema imunológico relativamente à água e quem diz à água, diz a outras coisas. Ainda há poucos meses escrevi neste blogue que qualquer dia estávamos iguais ao índios americanos quando os europeus lá chegaram e lhes ofereceram o vírus da gripe, para os corpos deles totalmente desconhecidos, dádiva mortal para o seu sistema imunológico e para a sua robustez física. A cigana durou à custa de uma imunidade natural. Penso que não terá levado qualquer vacina. Isto para dizer que o perfeccionismo científico, em último grau não só é impossível como acaba por ter o efeito exactamente ao contrário daquilo que foi desejado. A medicina, quando peca, peca por excesso. E é o que pode acontecer. O facto de ter sucesso nalgumas doenças não quer dizer que o padrão de doenças infectocontagiosas seja todo igual. Há vírus mais ousados que outros relativamente à mutações e nunca haverá vacinas para todas as mutações. É a mesma coisa do que seguir o encalço de Dr. Jekyll, e não deixar o Mr. Hyde andar à solta e pagar pelos seus próprios erros ou adaptar-se às circunstâncias da vida, esperando que este fique um pouco mais tranquilo com a idade. O Dr. Jekyll, esse irá ser sempre um Dr. Jekyll, convencido que é Deus e que com uma seringa, salva a humanidade inteira quando ao invés, anda a aniquilá-la. Já tinha advertido, logo nos começos da pandemia que qualquer dia e por este andar, não sobreviveremos sozinhos a uma gripe normal. Já faltou mais. A transdisciplinariedade continua a fazer falta: ela demonstra que o equilíbrio é composto por pequenos desequilíbrios. A tentativa de equilibrar à força e de uma só vez origina um grande desequilibro e a reposição do equilíbrio acaba por levar muito tempo e por ser muito mais difícil. Estes princípios adaptam-se até na sociedade ou na política… mas sinceramente, já nem me ralo muito uma vez que ninguém me ouve, nem lê. Resta-me cruzar os braços e ver o barco afundar-se e mandá-los a todos para o raio que os parta o que se torna redundante porque já lá estão.
domingo, 14 de março de 2021
Omisso
Já lá vão as horas, os anos e os danos e, se assim não fosse, tudo estaria parado em ruínas, feridas abertas e mesmo sendo belas, lembrariam a distância dos lugares por onde nunca andámos e isso fere. Obriga-nos a imaginar, quando não queremos imaginar nada. Queremos lá estar nesses lugares, sem a memória dessas ruínas. Os domingos e feriados foram eleitos para que o tempo parasse e nesse tempo não houvesse ruínas. Uma espécie de tempo elevado acima da multidão e dos afazeres, mas nunca houve um domingo igual a outro e os feriados, múltiplos e de diferentes formas, são a procissão, sem remédio, das nossas memórias. Horas, anos e danos, partem na sua viagem pelo tempo e com eles, os lânguidos domingos de ângulos de luz e os feriados das memórias distantes que imaginamos. No calendário há, de certeza um dia omisso, desconhecido por excesso de beleza e que os nossos sentidos não podem captar sem que haja horas, anos e danos...
O prisma
A obra de René Guénon, que tive o gosto de ler e de estudar de ponta a ponta, não tem um pingo de moralismo, algo que ele considerava, aliás, ser a parte "mais baixa" da religião, entendo as religiões como sendo as do Livro. Longe de querer dizer como devemos pensar para em seguida nos comportarmos de forma conivente com esse pensamento, ocupa-se antes das ideias, traves-mestras daquilo que consideramos ser "a existência", e da não existência também, já agora. Agrada-me e faz aparecer à memória as palavras de uma canção dos Pink Floyd:
"Não precisamos de nenhuma educação/ não precisamos de uma lavagem cerebral/ de nenhum sarcasmo na sala de aula./ Professor, deixe as crianças em paz./ Resumindo, você é apenas mais um tijolo no muro".
É difícil ser-se professor e manter estas ideias vivas e intactas, mas não é impossível. Ou o melhor é mesmo nem ser professor, de todo...
sábado, 13 de março de 2021
Sereias e suas teias
Os nomes das sereias são impronunciáveis porque são de uma
outra linguagem. Nós chamamos-lhes apenas “sereias” e nunca as vimos. Então
quando Adão nomeou os animais, as plantas e as coisas do mundo provavelmente
nomeou também o que não viu, mas imaginou. Imaginou seres meio mulher, meio
peixe e chamou-as “sereias”, mas não sabe a língua que elas utilizam para o nomear
a ele. Ele, na língua delas, pode até ser chamado de “Último Homem” o último
homem que lhes chamou “sereias” porque mais nenhum a seguir a ele lhes deu
outro nome e antes dele, não sabemos se houve outros na imaginação delas. Se é
que elas têm imaginação e não são apenas imaginadas. Podemos imaginar seres com
imaginação suficiente para imaginar outros seres com imaginação suficiente… e
assim sucessivamente, num eclodir de linguagens e imagens sem fim, sem que importe
onde começa e acaba essa imaginação. A nossa vida é apenas uma fatia de bolo
fermentado que cresce incessante dentro do forno, isto para uns. Para outros, a
nossa vida é um retalho na vida de um Deus o que é capaz de ir dar no mesmo.
Vida finita e exuberante como um pavão. E caem as falsas modéstias. Fica apenas
a verdadeira, a fatia ou o retalho e a exuberância solar que nos ilumina a
pele, os gestos, os percursos e a paisagem circundante. Somos um capítulo de um
livro que julgamos ser o livro inteiro e deixamos árvores, livros e filhos
atrás de nós não vá o livro continuar sem nós, coisa que não desejamos. O devir
é uma insanidade luminosa. Se pudesse, sentava-me à beira do devir como me
sentaria num furgão aberto em movimento, a vê-lo passar. Sem lhe tocar. Algo me
diz que movemos o mundo com os olhos. E, neste exacto momento, o carteiro trouxe
uma carta sem assinatura que me confirmou isso: A única originalidade consiste
apenas em mover o mundo com os olhos e em fazê-lo acreditar que ele se move por
si.
O salto
Raros foram os povos que, como o
nosso, tiveram acesso a tamanha reflexão sobre si próprios. A História foi
passada a pente fino e entrecruzada com a análise do temperamento português. Antes
de Freud, já nos evidenciávamos por não sabermos quem somos. Essa pequena questão
é, de facto, o grande passo para a Humanidade e não aquele na lua que foi só ir
mais longe numa extensão de espaço: também o Sol faz o mesmo e não se gaba.
Em doses letais, nós, por outro
lado, sempre oscilámos entre a admiração por nós próprios e a autoflagelação. Isso
torna-nos um povo permanentemente espantado connosco próprios. Se o espanto é
bom por um lado, pois essa capacidade de nos espantarmos releva uma abertura
interior e fresca, por outro aldo, viver em constante espanto, pode conduzir-nos
à inércia dos corpos em queda. Um espantado só está espantado e o espanto é tão
grande que não cede uma parcela da sua soberania a qualquer outro estado de
espírito. Com tão grande espanto não é possível que nos aconteça um projecto
nacional. Evidentemente que ele existe na virtualidade e não é pequeno. É um
espanto de projecto que passa pela redenção do mundo inteiro. O grão de
mostarda que somos, não se contenta com menos. Redimir o que seja não está na
moda e, por isso, é muito difícil passar desse estado de sonho uma vez sonhado
para a realidade que pensamos ser aquela que nos chega pelos sentidos a toda a
hora. A ciência e a sua autodenominada “qualidade de vida” veio a substituir
palavras como redenção, salvação, sublimação, absolvição, purgação,
recuperação, expiação… a qualidade de vida “científica” parece ficar-se por uma
espécie de saneamento básico do corpo, das mentalidades e do “equilíbrio
psicológico” cujos pratos da balança só estão equilibrados se a pessoa for “estável”,
”de bem consigo”, “de bem com os outros”, sem grandes sobressaltos ou
solavancos: a paixão, como delírio, é olhada com paternalismo, uma “fase”, uma
breve passagem pela loucura para que o matrimónio com o mundo, aborrecido e
aberrante, se instale, numa perpetuação da obediência a um contrato não pedido
para com os males do mundo. Em suma, o “estável” é aquele que aceita as coisas
como são porque já se aceitou como ser humano, coberto de fraquezas, defeitos e
fragilidades, tal qual o mundo e que aceita tudo, inclusivamente o seu papel no
que toca a perpetuar o mundo e as suas debilidades, num jogo espelhado. É assim
que se torna “príncipe deste mundo” e o espanto nunca o atravessa como uma lança
como atravessa este povo sempre que se supera a si próprio, tanto para o melhor
como para o pior. O sentimento de “incompletude da obra” é mais forte do que
qualquer estabilidade. Se é certo que estamos a descer vertiginosamente, em
queda livre, na verdade, não deixamos de estar espantados e espantados
chegaremos ao termo da descida, ou seja, no embate estaremos conscientes e com
todos os sentidos alerta. Despertos. Quem embate desperto não cai no chão, cai
numa rede e o pulo é imenso. É até capaz de voar. E voa. A redenção é uma
obtenção de uma parcela de liberdade. Se por um lado, como escreveu Gedeão, “pelo
sonho é que vamos”, por outro, pelo espanto é que voamos. Os dois juntos formam
a salvação que está a anos-luz das trevas da chamada “qualidade de vida” a qual
não foi ainda muito bem definida parecendo-se bastante com aquele lençol mais
curto do que o corpo. A qualidade de vida portuguesa nada tem a ver com a
qualidade de vida do saneamento básico nas suas múltiplas vertentes. É uma qualidade
que se projecta num outro mundo, sonhado e não neste onde nunca chegaremos a
príncipes. No outro, somos imperadores porque já nascemos nele e para ele
espantados, ainda que apenas sonhados. Por enquanto.
sexta-feira, 12 de março de 2021
Em brasa
Com o tempo, aprendemos a ouvir vozes que dizem, sobre a escrita de Pessoa, que esta é racional, quase fria. E isto por tantas vezes, ter o poeta dado a entender: "Sentir? Sinta quem lê". E os leitores preferem obedecer, e sentir por ele e tentar descortinar quem ele era, o que sentia, do que gostava, de quem gostava, como viveu. Mas nada nos diz que lhe tenhamos que obedecer. E nada nos diz, a nós, particularmente, para o visitar nos cafés ou num dos seus quartos, ou no escritório onde trabalhou. E quando deixamos de sentir por ele, em acto de pura liberdade desobediente, então percebemos que as suas palavras não têm a fria tonalidade da razão. Elas são brasa. Ferros em brasa que nos marcam e nos distinguem para sempre. Os seus versos, colam-se à pele. E mais do que o velho "reconhecimento" nele do que já pensámos, mais do que a reminiscência, quase platónica, que é o encontro com a sua poesia, é essa carga, profundamente espiritual, em brasa que, em último grau nos leva a viver as suas palavras no futuro. A vivê-las em vida. Vida colada a nós, como um sopro que desce e nos encaminha os passos nas trevas e em liberdade profunda que aquela que está sempre de acordo com o Espírito. De frio e racional apenas, este acontecimento, nada tem.
sexta-feira, 5 de março de 2021
O Império que se faz
O Império que se faz
Remetemo-nos para uma espécie de
interior, porque há várias espécies de interior. Nesta, o que vemos é aquilo
que vimos neste dia até ao ponto pérola do tempo que é atingido sempre que
escrevemos. E vimos já tanto desde que o sol nos acordou, afastando os sonhos
que pensamos nossos. Concluímos que nada ou pouco sabemos neste vaivém na
esfera da alma esférica. O dia é um leque de pétalas abrindo-se lentamente até
ao meio-dia e, depois, a partir do meio-dia zénite de esperança, vai-se
fechando lentamente, de um modo muito mais imperceptível do que quando se abriu.
A classe subatómica das palavras é da mesma natureza do que a dos gestos e, nem
uns, nem outros se repetem exatamente porque a intenção, grão de mostarda do
seu âmago, varia com as cores do dia e com os timbres de luz, sempre trémula
neste mundo, e nascendo espontaneamente como sementes sortidas lançadas à
terra. Se os dias passam por nós como imperadores, em carruagens douradas de fim
de dia, nós, num movimento aparentemente oposto, passamos pelos dias, como
imperadores de um império situado noutro hemisfério. Cruzamo-nos ao meio dia,
envoltos em verdes capas enquanto o sol, no alto, nos lembra o seu próprio império.
Há um triângulo natural que se forma entre nós, os dias e o sol, acima, a essa
hora. E a nítida evidência dele, clarifica-nos os gestos e as palavras e a luz
que do alto se deixa verter sobre esse instante. Há um meio dia para tudo, sem sombras,
nem análises excessivas. Apenas a evidência dos impérios brilhando em mármore, acompanhando
a luz de todas as horas: dourado, rosado, lilás… os impérios são sempre revelações
do que desconhecemos em nós e neles as cores aparecem e conjugam-se em padrões incansáveis
na demanda da variedade que é só verdade. Os únicos impérios de verdade são
tecidos, de avessos escondidos num canto do universo e, do outro lado, mármores
aos sóis. Todos os impérios são acompanhamentos do sol no seu percurso e neles
o sol nunca se põe porque o avesso do império é o contrário do sonho que o fez.
Quando o sol, pela manhã nos desperta e nos afasta os sonhos, revela-nos o
sonho maior que o império é. Sol, sonho e nós, o triângulo perfeito, em plena
atmosfera visível, a meio do dia, para além do tempo.
segunda-feira, 1 de março de 2021
Shtisel - um outro mundo