Nem me dá vontade de acordar de manhã. Para se ser herói ou
anti-herói por via da estupfacção com o azar das gentes. Está-se melhor a
dormir, longe, longe. Portugal só foi grande em tempo de reis, depois, embarcou
no barquinho republicano e ficou a dar às costas e às sortes. Há muita
filosofia por aí que disfarça que é política e muita divulgação das almas
nobres que encobre vícios obscuros. Pela manhã, rolas e pardais partilham
biscoitos no relvado das letras, serenos como o pôr-do-sol que há-de vir. Só me
animo a mirar o mar, suficientemente grande para os meus olhos. Os meus
companheiros de pensamento passaram a ser os cães que abanam a cauda com as
palavras que lhes digo. Não sabem do significado, mas conhecem o coração das
palavras o que é o suficiente. Os outros sabem todos os significados, mas
desconhecem o coração. De que lhes serve? É por isso que nunca abanam a cauda
nem se sentem felizes quando me vêem. É tudo tão mental que enjoa. Os cães,
pelo menos, são uns trapalhões mentais o que lhes dá graça e fazem-me rir com
gosto. Os outros, fazem-me rir com desgosto. São cassetes e cassetetes, cansaços
extremos. Não sinto saudades deles. Da presença deles. Se sentisse iria a
correr e arriscar-me-ia a tudo. Mas não sinto. Não posso fingir o que não
sinto, não me apetece ser meio poeta e ser poeta pela metade e fingir o que
deveras não sinto. Estou melhor no reino dos sonhos onde tudo é possível do que
aqui onde tudo é impossível. O planeta dos anti-milagres. Dos homens dos olhos
tristes e das mulheres protagonizáveis ao mínimo engano dos projectores.
domingo, 4 de outubro de 2020
Pela manhã
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