Tenho aqui em frente cinco vinhos que me ofereceram, e todos têm nomes sugestivos: Torre de Ferro, Valdeus, Pêra Doce, Mesa de Honra e Quinta das perdizes. Todos os nomes me remetem para o passado e há uma certa calma só por os contemplar. A sensação inversa que tenho quando vejo as imagens do Rock in Rio. Enchentes de campos sem flores, nem torres altas com reis de tristes destinos, nem mesas de honra (o que é isso da honra?) e muito menos quintas nos vales de Deus onde se passeiam perdizes enquanto as pereiras deixam cair pêras doces nas nossas mãos. O aroma destes vinhos está no próprio nome. E o paraíso aqui tão perto, na varanda de mármore, na brisa morna, nas colunas onde se sustêm cortinados leves, asas quasi transparentes que acentuam o silêncio do sonho onde, por fim, respiro. Esta vida tenho-a por engano e é na outra a que pertenço que, sem limites, estendo o olhar para a paisagem, tão interior por verdadeira. Empresto a minha vida a este tempo, como quem dá uma esmola e sabe, de antemão, que não resolve a miséria. Ainda procuro nela os sinais da outra que em mim trago porque a traguei num instante de eternidade, mas são tão implícitos como rótulos de vinho a quem ninguém interessa por já pensar na sonolência dos vapores, na pressa tão apressada ela mesma, de tragar estes tempos tão pouco eternos, tão breves e tão explícitos como nenhum rótulo de vinho o é. Na eternidade, ao invés, não há pressa nem tempo e a vida é o próprio vinho com tudo aquilo que o rótulo, nesta vida daqui, insinua, sem capa, nem contracapa, o livro eterno, sem princípio nem fim.
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