segunda-feira, 26 de maio de 2014

Novos Tempos




Novos tempos

Causa evidente de toda a desordem
É a submissão aos dias aparentados de dias
Na ordem possível tomada como néctar
Está o dia que se sobrepõe ao dia aparente

E se o barco atravessa o rio uma só vez
No alto do sol do meio-dia
E não regressa em nova viagem pela noite
Nunca ele volta em ser e as estrelas brilham

Nem pela metade das metades se fica
No sol que não doira apenas dura
Como face de lágrima a meio desgosto
Como lábios a meio de um fogo posto

Causa da desordem evidente é o sonho rarefeito
em bruma baça,  morna e invisível
E nem se dormita no alto do meio dia
Debaixo da árvore que é a própria vida

Gestos não há que não sejam destino
Toda contradição cabe nele
Suprimo as horas que adivinho
Se no Inverno se canta um hino
 
Não há tempo que não seja e se reveja
Do convés à proa que se eleva
E frente às ondas que não nos temem
Só a asa branca quente e rubra
a nova nau pressente e gera.

 (Cynthia Guimarães Taveira)

sábado, 24 de maio de 2014

Ponte



Afirmas não existir na existência
E existes na inexistência
No branco ardor da página
Onde vagas leves de palavras se abraçam
Onde se afastam inalteráveis
Afirmas o ser na tua ausência
E completas versos à distância
Doce lágrima d’ouro inscrita
Na constante ruína emergente

Apelas aos deuses um gesto
Que te redima de seres homem
Voltas a face que é paisagem
E nas valsas que danças
Aqueces o azul do nulo universo

Vastas impressões
Sacodem-te os sonhos transparentes
Ergues a tocha enquanto me olhas a sorrir
Nas cavernas ácidas aprumando almas

Nos desníveis não cais, nem sublimas
Só essa franca ausência tão presente
Parece chamar-me na outra margem
De névoas vestida e investida
Esse ténue fogo que vislumbro
Num cá sem aparente testemunho

Senão a arte que resumo
Nos horizontes possíveis
De todas as paisagens
Quando me ergo em voo puro 

Chamar-te-ia anjo se te visse
Ou estrela de amanhã se te inaugurasse
És sem nome aquele que vive
Em mim espelhando a outra face

 

Cynthia Guimarães Taveira)