domingo, 26 de junho de 2022

Vinho

 


Tenho aqui em frente cinco vinhos que me ofereceram, e todos têm nomes sugestivos: Torre de Ferro, Valdeus, Pêra Doce, Mesa de Honra e Quinta das perdizes. Todos os nomes me remetem para o passado e há uma certa calma só por os contemplar. A sensação inversa que tenho quando vejo as imagens do Rock in Rio. Enchentes de campos sem flores, nem torres altas com reis de tristes destinos, nem mesas de honra (o que é isso da honra?) e muito menos quintas nos vales de Deus onde se passeiam perdizes enquanto as pereiras deixam cair  pêras doces nas nossas mãos. O aroma destes vinhos está no próprio nome. E o paraíso aqui tão perto, na varanda de mármore, na brisa morna, nas colunas onde se sustêm cortinados leves, asas quasi transparentes que acentuam o silêncio do sonho onde, por fim, respiro. Esta vida tenho-a por engano e é na outra a que pertenço que, sem limites, estendo o olhar para a paisagem, tão interior por verdadeira. Empresto a minha vida a este tempo, como quem dá uma esmola e sabe, de antemão, que não resolve a miséria. Ainda procuro nela os sinais da outra que em mim trago porque a traguei num instante de eternidade, mas são tão implícitos como rótulos de vinho a quem ninguém interessa por já pensar na sonolência dos vapores, na pressa tão apressada ela mesma, de tragar estes tempos tão pouco eternos, tão breves e tão explícitos como nenhum rótulo de vinho o é. Na eternidade, ao invés, não há pressa nem tempo e a vida é o próprio vinho com tudo aquilo que o rótulo, nesta vida daqui, insinua, sem capa, nem contracapa, o livro eterno, sem princípio nem fim. 


quinta-feira, 23 de junho de 2022

Flores silvestres

 


Os sismógrafos não param. Parecem a venda livre dos argumentos desfeitos. Na tabela periódica dos tipologistas está tudo estagnado e separado por divisórias e estes adormecem descansados enquanto contemplam o seu mundo perfeito, exacto como a matemática (que é apenas um dos dedos de Deus). Já não encontro vagar nem disposição para respirar o mesmo ar claustrofóbico dos monges indefinidos entre o cavalo e o paramento (o único lugar na tabela periódica ocupado por dois tipos de ideia). Os sismógrafos não param porque eles estão sempre a tremer e a atacar, tal como os seus adversários constituídos por lama de esquerda. Hoje andei por Sintra. Um primor! Verdejante e livre de vermes, pelo menos naquela encosta... E que bem que estavam as flores! Pareciam ter sido pinceladas nos muros das quintarolas esquecidas. Chega-se a um ponto em que a função já não interessa e resta a resistência pura e simples do que somos, sem grandes pensamentos, apenas essa contemplação sem a mácula da tentativa de compreensão. E lembrar que perante Deus, estamos todos nús, como no Paraíso. Se as sereias passam, que passem, com as sua caudas de mar, se os centauros se erguem, que se elevem sem me incomodar, mesmo não cabendo na tabela em nenhum lugar, ainda assim passam mesmo que os diligentes da sabedoria possível ericem os seus espigões semi-atentos face a uma realidade maior... Diz a voz da Arte, que os sacerdotes estão entre os artistas e que os guerreiros se dispersaram nos campos de batalha para mais não serem vistos, nem nada serem. E, reservadas, as flores silvestres ignoram as batalhas dos campos onde florescem... Nada é para elas e tudo é delas, nas sua circular, perfeita e imparável roda imóvel. 

terça-feira, 21 de junho de 2022

A Árvore da Vida

 


Bill Bryson no seu livro “Uma Breve História de Quase Tudo” chama a atenção para o facto de a indústria automóvel ter aumentado consideravelmente o nível de poluição corporal que os homens possuem nos seus próprios corpos, estimando-se que seja 400 vezes superior ao que continha no início da Era automobilística. Evidentemente, já não somos o que éramos como seres humanos. Por outro lado, no alucinante livro de Jonathan Black “História Secreta do Mundo”, na página 66, conta o autor que “O que professores das escolas dos Mistérios pretenderam indicar com a vitória do deus Sol foi a importante transição de um Cosmos puramente mineral para um Cosmos florescente em vida vegetal” e que, segundo a tradição desses Mistérios, "germes únicos uniram-se em vastas estruturas flutuantes semelhantes a teias que encheram todo o Universo”, sendo essa fase recordada nos Vedas como a “Rede de Indra” constituída por “luminosos fios vivos perpetuamente entrelaçados, unindo-se com ondas de luz e depois voltando a dissolver-se” para mais tarde se entrelaçarem de novo, desta vez de forma mais permanente, em forma de árvore, árvore que seria o próprio Adão e tendo essas formas ficado cada vez mais densas e semelhantes às plantas de hoje. Segundo o mesmo autor, o sistema nervoso simpático, é semelhante a uma árvore. Por sua vez, Rebecca Wragg Sykes, na sua obra (altamente sistemática), “A Nossa Família - vida, amor, morte e arte dos Neandertais”, coloca em evidência o desenvolvimento humano como uma árvore, tendo vários “tipos” pré-humanos e humanos, sobrevivido, ora mais ou menos tempo, tendo-se alguns desenvolvido, outros não (não falo em evolução porque esta é muito subjetiva) e tendo os mais desenvolvidos coexistido com os mais primitivos, exatamente como hoje se passa, com as tribos primitivas a quilómetros da “civilização". E, assim,  ficamos com a noção de árvore em várias dimensões. Se é verdade que o próprio Cosmos começou por ser algo de muito subtil e luminoso, também será verdade que guardamos essa memória algures. Se é verdade que a nossa estrutura corporal não é destituída dessa subtileza podemos calcular o que é que o excesso de poluição pode provocar: as toxinas impedem o fluxo daquilo que deve fluir. Se é verdade que o mais primitivo coexiste com o mais desenvolvido, vemos que, tal como os tipos de Neandertais que aparecem e desaparecem e que esses vários “tipos” podem ter coexistido com o Homo Sapiens, também é natural que as civilizações, que se desenvolvem como ramos, em vários níveis e que, na antiguidade chegam a coexistir, também aparecem e desaparecem. Quando olhamos para a nossa civilização e a consideramos estar no topo da evolução, somos, no mínimo, ridículos. Os nossos níveis de toxinas corporais dá-nos, não só para a vaidade como para nos impedir de conhecer o lado invisível das coisas, algo a que, possivelmente um pré-humano teria mais acesso. É curioso que a subtileza desses filamentos entrelaçados iniciais esteja ligada à luz. E que luz seria essa? A relatada pelos místicos cristãos, ou pelos yogis, os que tentam a União, nos seus exercícios, queimando as ilusões como etapas? A nostalgia do Paraíso, quando o mundo era diferente e os seus habitantes também, invade-nos como uma onda e escrevem-se livros e livros na tentativa de compreensão e reconquista desse Estado Adâmico. Não deixa de ser uma forte contradição actual que tal aconteça: então não estamos nós na crista da onda da evolução? Não, e é por isso que esses livros são escritos e tantas vezes a par com ideias magníficas de soluções ideológicas para as sociedades: capitalismos, tecnocracias, comunismos, liberalismos etc e tal, sem se perceber que qualquer sociedade equilibrada é apenas produto do homem equilibrado consigo mesmo, ou talvez por outras palavras, com a Luz que transporta como resíduo do Início, luz que concentra as potências. Até lá, somos toxinas ambulantes, deprimidas, perto do negro chumbo, o mineral dos minerais, pior que o ferro... e como assim somos, a nossa consciência não vai além da do próprio animal (que não tem muita consciência de si próprio) e temos aí um problema: diziam os antigos que o homem é o único capaz de imitar qualquer animal, exactamente por os conter todos dentro de si: a esse nível somos algo que se desenvolveu bastante, algo que foi para além do animal, mas, como as toxinas e a amnésia nos fazem esquecer essa subtileza do “para além” tentamos resolver as questões sociais à semelhança dos animais e com a diferença de termos alguma, não muita, consciência disso: uns preferem organizações sociais tipo colmeias, outros tipo matilhas, outros tipo anarquias e por aí fora e, como uma desgraça nunca vem só, contamos com a esperança de vir a ser o tipo de organização escolhida aquela que irá mudar o Homem. Ora, seres profundamente intoxicados produzem, naturalmente, sociedades tóxicas, imagens rarefeitas, pequenos “flashs” (e não Fiats) apenas ou resíduos limitados da grandeza do ser humano. Aponta-se a Revolução Industrial como a causadora deste círculo vicioso. O que se ganhou em conforto, perdeu-se em Espírito. Não há aqui uma mensagem ideológica, há apenas uma mensagem de toxinas. Parece muito materialista, mas não é, até porque a matéria nem existe, é apenas uma densificação de qualquer coisa. Da luz, provavelmente, que contém, entre outras coisas, diversas formas de consciência. Graus de consciência e que resultam num Hino de Sabedoria e da Alegria. 

domingo, 19 de junho de 2022

A Grande Cegada


Sofro de mágoa daquela do abandono tão rica que é assim feita pelos que foram. E nessa mágoa grito como quem vende peixe e chocalho como quem sacode o tapete à janela e esse grito ecoa nas ruas e tremo por temer esquecê-la porque sem mágoa o coração não chocalha nem o seu grito se espalha. E eu quero que se ouça tudo bem ouvido, para que haja a passagem de testemunho da minha mágoa para os deuses e deles para os infames que me magoaram. O coração magoado só perdoa quando é ouvido e quando o seu chocalhar faz tremer os infames, tudo o resto é raciocínio claro, preciso e dado pelos ditames, onde é claro que o coração não arde em chamas, e, por isso, nem há perdão que se veja nem esquecimento que se contemple. A única justiça do mundo é o arrependimento dos infames no exacto momento em que o coração magoado é a flama da dor. Por isso, não me venham com ordens, nem jarreteiras, com sofismas e princípios, com lemas e lições, com ditos por não ditos, nada disso apaga a fogueira deste coração magoado só as lágrimas dos infames de arrependimento e bem colocado, no centro do ser onde, o testemunho dos deuses de volta, não traz a cabeça de Baptista, mas no lugar dela o cálice da dor dos enjaulados no seu orgulho tolo e cego de personagens de revista. 
 

sexta-feira, 17 de junho de 2022

Ora, bolas!

 Ora bolas! Aquilo que de mais importante tenho para dizer, é indizível!

Lodo

 


A espantosa ironia dos factos é aquela que apenas se prende ao lodo e fecha os olhos ao céu. Ainda dei voltas à cabeça a tentar entender mas, logo a seguir, fiz silêncio e, nele, a resposta surgiu como um ponto de luz. Dispersão, materialismo e soberba, eis a marca da nova juventude. Ou isso ou a estupidificação que a Igreja oferece a troco de uma suposta salvação. São estes os pólos em conflito. Depois, os restos de intelectualidade envelhecida que circulam por aí, queimam os últimos cartuchos reclamando a elegância perdida, mas sem olhos para a beleza, nem capacidade de ver as almas. Afinal, foram eles os geradores de tudo isto e é natural que assim seja. Pariram dementes e agora queixam-se da obra. Nos meus olhos claros de céu, sou a águia que não popa o voo e a caça a todos eles. Silenciosa a ave passa, rápida, inflamada pelo próprio sol, renascida a todas as horas do dia, sem a noite das estrelas, com o olhar fixo na luz. Maria Madalena abraçando o sol, como pintei há trinta anos, muito antes das Monas Lisas a duas dimensões e dos castanhos danados por Santos Graais. Forte, como um tambor, o meu coração pulsa ao ritmo do inferno que vislumbro quando voo quase em queda livre e os seguro subitamente com as minhas garras e os obrigo a contorcer-se no ar. Por fora estão estáticos e cheios de certezas, mas é o engano que trazem dentro de si aquele que a águia leva para os céus onde os deuses contemplam as entranhas oferecidas, onde as pesam e onde tecem, a partir delas, o futuro. Nunca terão elegância que desejam enquanto só olharem para o lodo e as novas gerações serão as mais enganadas e serão elas próprias o lodo que agora vos repulsa tanto... 

segunda-feira, 13 de junho de 2022

Muitos parabéns, meu amor

 

Olá querido Fernando.

E passou mais um ano. Feliz aniversário e saudades tuas. Pois por aqui, neste mundo côncavo e de abismos, os homens continuam a sua marcha em direção a lado nenhum. Depois do vírus,  uma guerra (há sempre guerras no mundo, mas como esta está mais próxima só se fala dela agora), e dizem que ela é o oriente contra o ocidente. Eu penso que é mais do mesmo porque as pessoas nem sabem o que é o ocidente nem sabem o que é o oriente, só conhecem as coordenadas da rosa dos ventos (e é quando conhecem...) e, como uns estão de um lado e os outros doutro dizem que a guerra é isso. Mas não é nada. O único interesse nesta guerra é o dinheiro, porque de História e de Cultura não sabem nada, nem de um lado nem do outro. Assim, como a maioria dos homens (eu sei que as mulheres para ti são inferiores, discordo de ti, naturalmente, mas amo-te muito) têm agressividade a mais no corpo e esta está toda mal direcionada, fazem guerras e são estúpidos que nem casas (até mais estúpidos do que as casas inteligentes). Também penso existir uma pulsão suicida no meio disto tudo: é o caminho inevitável do caos, poucos passam por ele e regressam renascidos e diferentes (estruturalmente diferentes). De maneira que temos as mais baixas pulsões e os mais medíocres instintos a comandar o mundo: o da  ganância, o da sobrevivência e o da tirania (tanto de um lado como do outro) e, quando é assim, tudo é igual a tudo, num tédio profundo e arrastado pela miséria fora... 

Quanto a ti, houve quem escrevesse a tua biografia. Ainda não a li porque não tive tempo, só li uma entrevista do autor e pareceu-me que o senhor era um produto desta época, um tanto ou quanto superficial e coerente com o absimo manifesto no qual nos encontramos. Quando tiver tempo, leio, mas não sei se aguento as mil páginas, muitas delas, segundo um crítico cá de casa, são palha suficiente para fazer uma cubata. Mas não quero falar sem conhecer. 

O resto continua na mesma. Não há sentido de comunidade em Portugal, cada vez mais é cada um por si o que torna impossível de concretizar qualquer projecto para o país (aqui para nós, e para não variar naquilo que conheces bem, algo muito semelhante ao que se passa na nossa vida). 

Fazes falta neste deambular em volta da própria cauda porque nos trazias sempre ideias criativas (mesmo que as ideias não fossem novas, nem tinham de ser: algumas velhas servem perfeitamente) capazes de nos fazer sorrir e pensar por sermos todos portugueses e por sermos, por isso, as tuas próprias palavras. Para que serve a língua portuguesa a não ser para ser o nosso próprio espelho? E que bela ela é,  tirando o Acordo Ortográfico que é um acto selvagem e idiota, sim, também ele produto da época. 

Assim, meu encanto, a única coisa que há a fazer é calar e continuar neste silêncio denso feito de concentrados de pensamentos e de emoções. Quando são provados pelos deuses (os únicos capazes de os provar) parecem extra condimentados como a comida indiana e eles dão estalos com a língua no céu da boca e arrepiam-se ligeiramente, e já é muito bom. 

Lembras-te de teres escrito sobre a "ilha próxima e remota"? É como nos encontramos alguns de nós, muito poucos. Somos a nossa própria ilha: tal como uma miragem, está próxima e, com um gesto, se afasta... Para quê mais do que isso? O mundo vai para onde escolhe e nós não vamos com ele. No outro dia disseram-me que estava a ficar velhota. Tive vontade de rir. O mundo é que está velho e eu só demasiado jovem para ele. Mas como o mundo fez o pacto de Dorian Gray, vê tudo ao contrário. Alguns de nós nasceram antes do tempo só porque vieram do lado de fora do tempo.

Um beijo enorme. 

Da sempre tua

Cynthia 

sexta-feira, 10 de junho de 2022

A coisa

 


Estou a ver esta "coisa" que mostra bem a promiscuidade entre os maus políticos e a péssima arte. Já ouvi dizer que para se entender a arte contemporânea é necessário sofrer-se uma espécie de iniciação nela porque sem ela não se entende nada. Evidentemente que esta é mais uma marca deste mundo actual: o objectivo da suposta "iniciação" é o caos. E o objectivo da Iniciação verdadeira é a libertação do próprio cosmos (ou ordem), algo muito diferente. 

O maravilhoso casamento entre a política e os artistas de Estado é o mundo actual porque a vida imita a arte e a arte imita a vida. 

Há "iniciações" que só de olhar, não dá vontade. E cada vez há mais... 

Quando os políticos apadrinham "coisas" contemporâneas é inevitável que errem em tudo o resto e quando os artistas, não são artistas, mas seres que se arrastam nas modas e "naquilo que está a dar" produzem uma sociedade à sua medida, imagem e semelhança. 

Não é em vão que tudo esteja em queda livre. O caos só é belo quando goza das virtudes da força, da sabedoria e da beleza e isso é muito raro. Quando perde esse mecanismo interno que torna a arte sagrada perde o pé e a nossa sociedade atira-se para o abismo de livre vontade. 

É por tudo isto que não voto e é por tudo isso que não gosto de arte contemporânea. É por ser altamente repelente, feia, amarga e profundamente estúpida disfarçando-se de inteligência superior. Tantos séculos de boa arte e não aprenderam nada... 

quarta-feira, 1 de junho de 2022

"Mas o melhor do mundo, são as crianças"



Perguntar a falsos mestres é tão perigoso como uma tempestade que se aproxima. O meu mestre, sem que o saiba bem, é Fernando Pessoa. Tornou-me a mim a tempestade dos seus escritos. Possuir a poesia nos dias do coração é tão ingrato... Porque como ela, é invisível aos homens comuns. Quem a nota são as crianças. Alunos próximos do coração dos dias. Tão próximos que sabem. Ensinar é uma transfusão de sentimentos. Viver com a tempestade da poesia pelos dias é saber que há um olho do furacão. A paz profunda no centro de tudo. Estranha metáfora que a natureza escolheu para quem está condenado a sentir na pele a atmosfera da escrita. Não perguntar a falsos mestres é ter a sorte de ser a metáfora de um poema de um poeta-mestre que nunca o quis ser. A poesia torna-se ainda mais sublime porque ouvida apenas pelas crianças que conhecem os dias de chuva quando faz sol e não se enganam nos sentimentos que lhe foram insuflados pela manhã que são os seus dias. Todos os outros se enganam e tropeçam nas vírgulas do caminho. A atmosfera da poesia é a brisa que passa, sem vírgulas, sem inspirações. Toda ela é uma expiração contínua que, contraindo o universo, se expande no nosso interior, balança d'oiro, jóia maior intuída pelos príncipes e princesas de um mundo novo. Os outros são, em si, vírgulas no caminho, incapazes de intuir o sol em dias de chuva e a chuva em dias de sol. Apercebem-se apenas da pele largada pela serpente que são... Já as asas, lhes fogem como canções desconhecidas enquanto apelam ao sucesso e à sabedoria que só o meu mestre tem, sem que saiba que a tem. O vínculo é estranho. O vinco que o poeta deixa no meu ser, ainda mais. O meu mestre fala através do paradoxo que sou. E as crianças sustém a respiração por verem a lágrima invisível da chuva miúda como elas caindo por entre o sorriso. Também delas é o céu e o olho que tudo vê, na mais cinzenta tempestade. São campos verdes por onde todos corrermos por entre palavras que são o nosso pólen. Em Portugal, a rosa vive por entre as pedras e trazida nas grinaldas das crianças com que cobrem as coroas de espinhos e de louro dos poetas. E ser assim, ser a vida da poesia incrustada na vida das palavras é a incrível verdade invisível aos olhos dos falsos mestres.