terça-feira, 27 de novembro de 2018
Touradas
Senhora Ministra da Cultura e possuidora também da Pasta da Comunicação Social:
Venho por este meio citar Lucas Benoist no seu livro "La Cuisine des Anges, une esthétique de la pensée" que, por sua vez, é citado por René Guénon nos "Símbolos fundamentais da Ciência Religiosa" pág. 23 ed. Pensamento:
"... O interesse profundo de todas as tradições ditas populares reside em especial no facto de que não são populares na origem.
Assim, amiga Ministra, proponho-lhe um desafio: tentar encontrar aquilo que "não é popular na origem". Se encontrar, só isso, e apenas isso lhe dará legitimidade para dizer o que se entende por "civilização". A civilização não é uma criação de Vossa Excelência. Não é um episódio de telenovela que pode ser re-escrito conforme o desejo da audiência. Até porque a audiência, na maioria das vezes, não "ouve" porque está distraída a ouvir Ministras da Cultura que lhes dizem o que é Civilização e o que não é Civilização. Assim, deixo-lhe o desafio de encontrar "aquilo que não é popular de origem" até porque a Ministra, já se tornou bastante popular com as suas afirmações.
segunda-feira, 26 de novembro de 2018
Microcosmos
Abre, em sossego, os olhos
à paisagem porque ela própria
só abre os olhos em sossego
para ela própria
Nestes tempos de sombras
Ritos sem ritos
Vestes sem vestes
Palavras sem palavra
Ocasos aplaudidos nos Cabos...
Torna-te paisagem
Pelo próprio gesto dela
Claríssimo e solene
Não osciles na tua alma pura
Sê como essa árvore de braços longos
Ligando todas as direcções
Sê um universo sem noite
Toda paisagem é ela e o seu reverso.
(Cynthia Guimarães Taveira)
domingo, 25 de novembro de 2018
A Novi-civilização
A novi-civilização é composta por novi-santos porque neles, graças à novi-educação todas as pulsões negativas foram eliminadas. Vivem na paz de um Senhor que pode existir ou não consoante a escolha da religião de escaparate de supermercado. Não fazem mal aos animais nem os comem. Sao todos vega (a caminho da ausência de dentes pelos tenros vegetais - que não são seres vivos...), o sexo é fluído porque varia no género e do engate feito de imagens projectadas pelos interessados no "plano subtil", ou antes, neo-subtil. A arquitectura é neo-sagrada, baseada na harmonia dos números pitagóricos e não só, depende da tal neo-religião de escaparate de supermercado. As neo-crianças serão educadas no sentido da paz e da harmonia com regras de cidadania embutidas na mecânica dos gestos. A neo-civilização será produto da neo-consciência que nunca será individual mas colectiva-integrante-de-toda-as-diferenças tendencialmente difusas e atenuantes de qualquer atrito, obstáculo ou dificuldade no que toca ao pleno entendimento do "outro" que nada mais é do que um "eu" sob outra forma, sujeito imprescindível para a bem aventurança das nossas boas acções de consciência colectiva.
Ando deliciada com esta novi-civilização e com esta tão esperada erradicação do mal do consciente, do inconsciente e do subconsciente. Afinal, já não somos todos humanos. Também não somos deuses, nem Deus, nem extraterrestres. Cá para mim, se calhar nem somos coisa nenhuma, porque o ser, verdadeiramente, não existe, foi substituído por uma neo-estrutura-funcional autofágica possuidora do dom da eternidade graças ao avançado estado da tecnologia na área da saúde e ao facto de sermos todos vega porque as plantas não são seres vivos. Se fossem nem existiamos. Isso é que era bom.
Cynthia Guimarães Taveira
sábado, 24 de novembro de 2018
A Pomba
Três filhos, um da teosofia, outro do Socialismo e outro do Nacional Socialismo foram à loja do racionalismo e compraram a Razão, a Dialéctica e a Razão Transcendente e, em seguida, foram para o café e conversaram sobre a Razão com todas as razões. O Espírito Santo pairava noutro lugar mas, ainda assim, eles viram uma pomba sobre as suas cabeças e ficaram muito contentes. A pomba teve um descuido gastrointestinal e deixou cair um repuxo "divino" no centro da mesa. Eis as maravilhas da actualidade noticiosa.
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
A falta
Desenho de Cynthia Guimarães Taveira
Depois de ler "0 romance de Leonardo de Vinci" de Dimitri Merejkoski e de ver "O Pesadelo na Cozinha" de Ljubomir, cujas técnicas de aprendizagem orientais são aplicadas aos cozinheiros lusitanos que dormem em pé, tive o estranho pesadelo no qual a mensagem era simples: a qualidade não tem espaço onde há falta dela. Não há diferença entre esses donos de restaurante, sobretudo os homens, e esse contexto embebido em lutas pelo poder do qual Leonardo foi vitima pela incompreensão a que foi votado. Esses donos de restaurante, dormentes excepto no orgulho, inóspitos na criatividade, incompetentes como seres humanos, são os mesmos que destruíram o Cavalo de Bronze de Leonardo. O princípio é o mesmo.
(Cynthia Guimarães Taveira)
sábado, 3 de novembro de 2018
Olá Brasil
Quando a Família Real Portuguesa, em fuga, é certo, chegou ao Brasil aquilo que fez foi criar Instituições. Ora os portugueses, vá-se lá saber porquê, são muito intuitivos, (ou antes até sabemos: é porque possuem um jeito nato para lidar com situações fora do seu país de origem), e perceberam logo que elas faziam falta nessa terra. E continuam a fazer. O principal problema do Brasil é a ausência de Instituições que funcionem. Nao é a Ordem (como um todo verificável) nem o Progresso (como uma epifania permanente), são Instituições, umas ligadas ao Estado, outras nem por isso, mas que, de alguma forma, façam a sugestão permanente na cabeça dos brasileiros de que alguma coisa pode funcionar sem serem necessários "esquemas", como tem sido esse o "timbre" cultural dos brasileiros. Ora o "esquema" é uma decadência do "desenrascanço" (timbre português). Assim, nao é de tiros, nem de ditaduras militares de direita, nem de esquerdas pós-modernas encharcadas em esquemas de séculos e também não é de Ordem ou de Progresso aquilo de que o Brasil necessita. Necessita de portugueses quando já não se lembram de deles ou só se lembram como um bode expiatório que de tão velho já perdeu o charme. Quando se lembram dos portugueses, e a memória é viva e positiva, então já não necessitam de portugueses para coisa nenhuma porque o melhor deles já foi incorporado. E a isto, meus "irmãos", é que se chama Independência. A Ordem e o Progresso fica bem abaixo da Liberdade que devia ser o vosso verdadeiro lema. Foi para isso que fizemos um Império. Para libertar.
terça-feira, 15 de maio de 2018
Três pinturas
(fotografia de Maria do Céu da Costa)
Très Pinturas de Cynthia Guimarães Taveira
A propósito do encontro promovido
pela Ordem de Ourique (subordinado a temáticas debruçadas sobre o Futuro, a
Tecnologia e a Ciência) que aconteceu no dia 12 de Maio de 2018, no Mosteiro de
Santa Maria na Ajuda em Lisboa, foi-me sugerido que levasse três obras
pictóricas, à minha escolha e de minha autoria e que, de alguma forma, as
apresentasse ou discorresse sobre elas. Em simultâneo, nesse mês, de entre as
disponíveis, outras treze obras tiveram de ser escolhidas para uma exposição
patente num restaurante em Arruda dos Vinhos. Dei por mim a selecionar com
cuidado aquelas que iriam para um local e as que iriam para outro. Posto isto,
direcionei “As Tulipas”, “O Anjo” e “O Cisne” para a Ordem de Ourique pois
entendi serem elas amostras de um percurso pessoal indissociável do pensamento
e da filosofia, a par com uma “mística”, o que em rigor anda, igualmente, a par
e passo com a mesma Ordem e com os propósitos pelos quais foi criada de origem:
pensar e agir «portugalidade».
Embora não constem nas obras
símbolos tipicamente portugueses, como a Cruz de Cristo ou a Esfera Armilar, ou
bandeiras, ou Cordas Manuelinas, ou Caravelas, ou Barcas ou Corvos, ou ondas do
mar, o que é certo é que o percurso artístico, místico e espiritual da autora
não teria sido o mesmo se, desde muito cedo, por volta dos 13 anos, não tivesse
havido um encontro com a Temática da Portugalidade através do poeta Fernando
Pessoa, e poucos anos depois, dois ou três,
o encontro com a obra de Dalila Pereira da Costa. O que é certo é que
mesmo não estando visível pelos seus símbolos comuns, essa Portugalidade está
por detrás de cada obra elaborada. E quando dizemos de cada obra pictórica,
dizemos todas, sem excepção. A razão disto prende-se com a paralela e, ao mesmo
tempo, una, relação que existe entre a descoberta do País e a auto-descoberta
pessoal. Nestes tempos “modernos” e de globalização”, Portugal torna-se caso
raro nessa possibilidade dupla e harmoniosa, mantendo sempre em aberto (e contra
todas as probabilidades e expectativas) a possibilidade de ser este um país
verdadeiramente iniciático, com mortes e renascimentos, para quem se predisponha,
com a mesma abertura que o país releva e revela a todos aqueles que escolhe
(sendo o país iniciático, ele é que escolhe quem o procura…).
Assim, e começando pela obra “O
Anjo”, duas figuras esguias, procurando por essa forma fazer a ponte entre o
céu e a terra (base da identidade da espécie humana, muito mais do que um
simples acrescento genético ao chimpanzé), uma humana, outra angelical (com
asas visíveis), tocam-se em baixo, gerando, deste modo, o fogo. A razão pela
qual esse toque aparece em baixo, e não em cima, prende-se com a Descoberta da
Presença Celeste na Terra. Só assim, e não de uma forma meramente utópica ou
idealista, se pode dizer que essa Descoberta existiu ou, dito de outro modo, é
no coração carnal, aquele mesmo que bombeando o sangue consegue em simultâneo
pensar e sentir que essa Descoberta do Transcendente se faz. Sem ele, em profunda
abertura para o mundo e para o supra-mundo, nenhuma Revelação é acessível ou
possível, sequer. É, aliás, a presença do corpo que nos distingue dos anjos…
quando se dá essa Descoberta que, segundo as “linhagens espirituais”, pode ser
tanto um encontro com o “totalmente outro”, usando os termos de Otto Rahn, como
um “desdobramento do próprio ser” que assim entra em contacto com o seu lado
angelical (ou centelha divina, que todos trazem consigo) ou ainda, ambos os
casos ocorrendo no mesmo ser.
Essa descoberta ou Revelação ou
ambas, geram energia ou fogo que visa sempre a transmutação. Os adjectivos
desse fogo são inúmeros e dependem também de linhagem para linhagem. Falamos em
linhagem pois não consideramos que a espiritualidade se prenda única e exclusivamente
com “escolas”, indo muito além do pensamento teórico e filosófico devido a
inúmeros factores (genético, memórias genéticas, memórias de vidas passadas – o
caso de Dalila Pereira de Costa, por exemplo, história pessoal, escolhas
divinas, nascimentos com missões bem estipuladas, etc…) poderem estar presentes
no seu desenvolvimento e também não falamos de evolução por ser este um termo
Darwinista, não permitindo a deslocação qualitativa no espaço-tempo, sendo o
termo desenvolvimento mais integrador, tanto de movimentos cíclicos como
escatológicos.
O fogo que surge é, em altura e
em figura (esguia) semelhante aos dois seres que estendem a mão para o tocar e
para se tocarem, quase como se fosse um terceiro ser ou coluna/sustentáculo
desse mesmo desenvolvimento. Todo o diálogo se inicia deste modo, toda a
transformação é possível a partir desta evidência. Cada um dos seres tem uma
espécie de pregador em forma de flor, embora com cores diferentes. Cada um
possui uma forma de Sabedoria específica, pétalas falantes, revelações próprias
em abertura e diálogo. Vemos então que todo este misticismo se baseia em
movimento e em dinâmica, qualidade da palavra Vida, sendo a Morte, como paragem
ou inércia, apenas uma face da Vida.
De seguida temos a obra
“Tulipas”. Nela uma espécie de deusa consegue o prodígio do equilibro na mais
profunda assimetrias das tulipas que dela surgem. A tulipa, mesmo depois de
colhida, cresce, em água, cerca de um centímetro por dia, o que, para quem faz
arranjos de flores que duram vários dias, se torna candidato à pré-visão (imaginar qual o tamanho que a tulipa terá
daí a dois dias, por exemplo, e fazer um arranjo que conte com essa
característica da tulipa, não estragando a harmonia do total do arranjo),
torna-se, muito facilmente, para quem com flores trabalha, num símbolo ligado à
capacidade visionária. É também uma flor extremamente sensível à temperatura.
Abre-se muito rapidamente se retirada do frigorífico e volta a fechar-se se
voltar para ele. É, portanto, uma flor com grande sensibilidade para o
calor/fogo, mudando rapidamente o que também, para quem trabalha com flores,
remete para o futuro local onde a flor será instalada, se ao ar livre, se não,
se num local com baixa temperatura, se não o que invariavelmente compromete o
efeito que a flor virá a ter quando se faz um arranjo com ela. Assim, entre o
extremamente volátil no tamanho e na forma, torna-se uma flor que requer
precisão e sabedoria, uma segurança adquirida com os anos. Tal como o
equilíbrio dentro da assimetria, sem comprometer a harmonia, para além de ser
este um espírito Barroco, requer o conhecimento endógeno de uma certa geometria
sagrada e uma segurança total. Essa segurança remete naturalmente para a existência,
no ser humano, de um eixo fixo, permanente, exacto que está presente na
pintura, a azul: um vidro sólido que atravessa todo o ser. Só assim, é possível
o que, à primeira vista, parece ser impossível, a harmonia dentro da aparente
desarmonia com que as tulipas surgem. E surgem em movimento (embora estáticas
em pintura – a pintura não é cinema), ou seja, a ideia com que se fica é que
estas sete túlipas se movem, se transformam em torno de um eixo, o motor Imóvel
da Tradição, sendo em número de sete, “o ciclo completo, a perfeição dinâmica”
(em movimento), tal como está na entrada para a palavra “Sete” no Dicionário de
Símbolos de Jean Chevalier e Alain Gheerbrant. O ouro que rodeia a figura, é,
por si mesmo, um símbolo de realeza… a rosa central prende-se com a Sabedoria,
naturalmente. Ou seja, no centro do centro, está a Sabedoria.
Por fim, temos a obra “O Cisne”,
que nos aparece por entre flores, quase como uma parede, obrigando-nos a fazer
com o olhar a separação entre dois planos: aquele que está mais perto de nós, e
esse outro, o do cisne dominado, digamos assim, por uma figura humana. Mas se
olharmos melhor, e podemos começar a análise por aí, o sol e a lua estão
presentes. Aliás, dois sois e uma lua estão presentes como verdadeiro pano de
fundo. Um dos sóis é claro, outro escuro e a lua é azulada… o mundo
crepuscular, onde céu e terra se fundem, visão difusa por entre as ramagens com
flores (rosas). O cisne como o que consegue não sentir nem frio nem calor, uma
certa pureza inocente nas suas alvas penas, cuja curvatura do pescoço é suave e
o seu deslizar pelas águas turbulentas do mundo mais suave e sereno ainda… o
local, por excelência, onde se descobre que o sol é negro e que o verdadeiro
sol é interior ou anterior à criação deste mundo turbulento a partir da
volatilidade das águas, turbulentas e instáveis, às quais se sobrepõe o cisne
deslizante, quase imperturbável na sua forma externa… um paraíso acessível.
Talvez até demasiado acessível… Se assim o é, porque é que a figura o “domina”
de alguma forma? Por vontade dupla de se fundir com ele e de o transcender, de
estar para além dele (mundo crepuscular, lembro, onde os opostos convivem em
fusão – o Regime Nocturno ou Místico lembrado por Gilbert Durand na sua obra
“Estruturas Antropológicas do Imaginário”, dando este “Regime” o nome a um
capítulo inteiro subdividido em vários. Um Regime, ou um estado apelativo, com
intenções de permanência eterna, mas, ainda assim, demasiado acessível. Lembro
a Confraria a que pertenceu Hieronymus Bosch, esse grande pintor e também visionário,
cujo animal escolhido para a assinalar era um cisne que, estranhamente, acabava
num prato, uma vez por ano, e comido pelos confrades numa celebração… estranho
rito este, associado a este sereno animal, capaz de deslizar em ritmo
permanente nas águas, símbolo de impermanência. A ambiguidade ritual é extrema,
integrando o animal no corpo ao ser comido e, em simultâneo, uma espécie de
“corte” com o símbolo, muito semelhante, aliás, ao “partir da cruz” de que
foram acusados os Templários… talvez porque, até o próprio símbolo seja algo a
transcender, tal como aquilo que o símbolo simboliza. Uma procura de liberdade total,
indo para além da noite e do dia ou do crepúsculo, como símbolo apenas da
verdadeira união entre sol e lua e não a união em si. Ou, dito doutro modo, a
procura do Sinal (algo com apenas um sentido) mas actuante no mundo, por já ter
percorrido a esfera da diversidade simbólica. Actividade só possível depois
dessa viagem pelos e nos símbolos. É, então, uma obra que enuncia a
complexidade iniciática e, ao mesmo tempo, anuncia uma saída do labirinto tão
presente nas ramagens cobertas de múltiplas rosas ou sabedorias (e não só uma).
Uma procura, portanto, da Unidade.
Certo é que a autora vê o que faz
de um modo e que os observadores a verão de outros modos. Isso é certo e rico. No
entanto, o acrescento de um texto é sempre bom numa época de “Imagens”
praticamente mudas e sem grande significado: estamos rodeados de imagens, de
manhã à noite, sem a sua dimensão da palavra (verdadeiro motor da imagem),
porque provinda da Consciência. A Palavra tende para a Consciência e pode
contrariar inconsciência ou subconsciência da Imagem.
Num encontro cuja proposta era a
de se conversar sobre o Futuro e sobre a Tecnologia Moderna, o contraponto será
sempre a Mão Humana, capaz de criar directamente a partir de uma matéria-prima
e de falar sobre o Futuro, mas de uma outra maneira. De uma maneira mais
artística, digamos assim.
Cynthia Guimarães Taveira
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