domingo, 22 de junho de 2014

O Mistério da Escada do Palácio



De como podemos ir reparando em matérias para pensar:

Ontem trouxeram-me o livro “A Terra Prometida – Maçonaria, Kabbalah, Martinismo & Quinto Império” constituindo o Primeiro Volume das Obras Completas de António Telmo, organizado, anotado e transcrito por Pedro Martins e com comentários de Eduardo Aroso e António Carlos Carvalho numa edição da Zéfiro. Entretida fiquei a ler, sorrindo, por vezes, com a ironia, característica da qual António Telmo participava de forma exímia...  e a páginas tantas, concretamente na página 133, escreve António Telmo enquanto se debate com enigmas: “ Ora, se eu bem o entendo, o que ele nos está a dizer é que a verdadeira compreensão da qual nasce a verdadeira força, a verdadeira energia, aquela que nos eleva e não aquela que no arrasta para os submundos, só vem quando, simultaneamente, aplicamos ao conhecimento da vida, do universo, de nós próprios ou até mesmo de qualquer objecto, os nossos três centros essenciais que chamamos vulgarmente instinto, sentimento e pensamento. Como fazer? É claro que isto não se explica, mas podemos pelo menos tentar fazê-lo ao pensar e sentir simultaneamente. Porque dessa forma saímos do processo de identificação, tão comum aos portugueses como o notam os brasileiros que, acerca de nós, dizem, por exemplo, que nos confundimos com a profissão. Os portugueses preferem ser o Sr. Advogado, o Sr. Primeiro Ministro em vez de ser o  Sr. Durão Barroso. O mesmo acontece com os meus colegas professores. Eu não sou professor, exerço a profissão de professor e chego por vezes a dizer que alguns colegas estão convencidos de que são professor”. Lido o livro, abri o computador e lá me encaminhei para o facebook (uma espécie de curiosidade mórbida que alimento nos últimos anos requerendo tratamento, ainda não sei se urgente ou paciente...)  e eis que dou de caras com um denominado “post”, (palavra que já se começa a introduzir assumindo formas surpreendentes tais como, “postar”, “postaste”, “postei”) que tinha um link (lá está o Inglês), ou ligação  para a seguinte notícia: http://www.dn.pt/Inicio/interior.aspx?content_id=634934&page=-1#.U6AnlII922o.facebook

Achei curiosa a coincidência e achei ainda mais graça a um comentário que li sobre essa mesma notícia e que posso transcrever porque ele próprio é uma transcrição de uma história de Bocage:

“Conta-se que Bocage, ao chegar a casa um certo dia, ouviu um barulho estranho vindo do quintal. Chegando lá, constatou que um ladrão tentava levar os seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com os seus amados patos, disse-lhe:

- Oh, bucéfalo anácrono! Não te interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo acto vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo... mas se é para zombares da minha elevada prosopopeia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com a minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada.
E o ladrão, confuso, diz:
-Doutor, afinal levo ou deixo os patos?”

 Com isto tudo lembrei-me também de um poema de Ricardo Reis (heterónimo de Fernando Pessoa):

“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.”

Ricardo Reis, 14-2-1933

 Os acasos, por vezes para além da sua graça, podem levar-nos a pensar e muito e, este levanta inúmeras questões todas elas bem visíveis... o que somos? O que fazemos? O que é a hierarquia? Quem somos?


(Cynthia Guimarães Taveira)

Sem comentários:

Enviar um comentário