Prefiro esta parcimónia campestre a esta nova fauna da cidade acoplada ao carrocel das lojas que abrem e fecham à velocidade da luz. Insisto em manter uma integridade invisível aos homens, apenas captada pela lente celeste. O mundo, imundo, incorpora o corpos de gentes que só pedem e só se contentam com o mínimo e, pelo menos neste estado campestre, qualquer flor evoca a grande roda cósmica, invisível aos homens, mas visível para os grandes olhos dos deuses. Tudo, na capital, que já não é capital de coisa nenhuma a não ser dos dinheiros (e muito menos cabeça de qualquer Império), evoca o cansaço da ditadura da medida. O mensurável é o grande polvo com tentáculos gelatinosos pejado de ventosas que se agarram a tudo e que desconhecem o perfume das flores. Já nada me diz o brilho da noite das cidades que faz murchar as estrelas e evoca procissões de fantasmas cuja alma partiu há muito. Reservo para mim mesma a beleza como um presente, sinceramente merecido e não a desperdiço nas vielas da moda e nos sinceramente ignorantes de tudo. Permito que a beleza, força suprema da sabedoria, impere em cada tremeluzir do mar e retenho esses fragmentos luminosos nos meus pensamentos. A vanguarda mais ousada e arriscada é a de já não se ser daqui e passar por entre a gentes que nada são como se o nada fosse eu, enganando-as com a imagem de si próprias, não porque as queira enganar, mas porque está na sua natureza viver no engano. Suponho que herdei as histórias mais sublimes, impossíveis de contar a alglomerados de ossos que apenas esperam o Juízo Final com os braços sem carne cruzados sobre o peito onde não mora qualquer coração batendo. A fauna citadina está incrivelmente fraca enquanto se distrai com achados científicos que, de tão incontornáveis serem, se tornam muros onde esbarram e lhes tiram a liberdade. Prefiro construir, eu mesma, os meus muros de cristal, sensíveis ao toque de uma asa e ecoando pelo universo a musicalidade da carícia de um pássaro. Tudo definha excepto os meus sonhos que acompanham os estados do ser. E não há mão, tentáculo ou vontade que os consiga agarrar e aprisionar num qualquer conceito pronto a vestir. É trágico? É. Excepto a minha alma que é sublime e se eleva sempre que as asas se abrem. Já não tenho pena desta tragédia humana, apenas me espanto com a falta de capacidade que há para ver, para escutar e para reconhecer a beleza como a soberana e mais alta virtude que aos humanos é dada conhecer, se soubessem fazer e estar no silêncio, invisível aos homens, mas mansão absoluta e absolutamente dos deuses.
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