terça-feira, 17 de março de 2015

Dizem que todos são mistérios...



Dizem que todos são mistérios
mas o mistério está
no mistério que sentimos ser,
o mistério que os outros são
 
É com emoção
que me aproximo de ti ser-igual
reunido de igual mistério
do mistério que sou
 
Eternos desconhecidos de nós
e dos outros que mistérios são...
Há tanta igualdade no mistério,
como no silencio que cobre as estrelas...
A poesia é o disfarce desse silêncio...
 
É com emoção incontrolada por dentro
e controlada por fora que me dirijo a ti,
altar de um deus a conhecer.
Tremem os joelhos, oscilam os equilíbrios
na verdade que és, do mistério que sou.
 
É com esta emoção,
de quem toca a vida pela primeira vez,
que me aproximo de ti, ser,
sabendo-te o mistério do infinito,
incapaz de te perceber,
nem no mistério que em mim habita...
 
Todo o entendimento é já lembrança,
aprisionando liberdades futuras...

(Se entendes não alcanças
o mistério do mistério que em ser me formou)
 
O mistério só é livre,
nada mais é para ser
se me dás parte dele
a outra parte já voou...
 
És uma liberdade voada,
no instante
da verdade encontrada.
 
 
(Cynthia Guimarães Taveira)

quarta-feira, 11 de março de 2015

Vida clara




Ah, esta vida clara
Sem alto ou baixo
Nem lembranças
Nem promessas
Tão clara, tão momento
Tão investida de esperança
Vida clara e matriz
Tão intensamente suspensa
Árvore erguida face ao nada
De ramos soltos pela raiz
Ah, sorte, fortuna é apenas
Esse respirar depois do mar
Todo o homem é um dilúvio
Todo ele regressou em pomba
Todo ele é uma ruína
Reconstruída num olhar...

 
(Cynthia Guimarães Taveira)

terça-feira, 10 de março de 2015

Mais alto...


Não há nada que me diga
que não me escutes desse lado,
nada que te isole, nada que te seja ilha.
Não tens silêncio,
uma alma cheia nunca tem silêncio...
e até o Espírito ilumina e perturba...
O vazio é uma impossibilidade física
e metafisica.
Não há nada que seja
mais alto do que a vida.

 
(Cynthia Guimarães Taveira)

A esfera e a formação da rima

 
 
Não há qualquer recanto
no recanto dos pensamentos,
nesta estrada não há cantos,
talvez segredos e nada menos
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Nada se ergue sozinho,
nem o prumo de um fio...
Sabe sempre tão a pouco
não ser menos que infinito...
 
 
Veste a orla das ondas,
a praia com esse vestido,
sem ela seria apenas
um triste fim do destino...
 
 
Todas estas cores,
as que vejo e admiro,
são ideias de umas outras,
Não as vendo lhes sigo o fio...
 
 
Vive quem não sabe
Saber é quase longe
É nesse nunca alcançar
Que ir sabendo é como dar...
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Tudo é redondo afinal
Nesta bola de cristal,
As ondas, as cores, o prumo
As faces de um mesmo sinal.

(Cynthia Guimarães Taveira)
 

domingo, 8 de março de 2015

O fruto proíbido é o ...


Para falar rotundamente escrevo poesia e rotundamente falando, como redondo é o fruto, redondamente ela se apresenta para ser mordida. Para falar psicologicamente, assim em jeito de prosa, psicológicamente ir compreendendo, falo em jeito de serpente, sibilo aqui e ali, verdades vagamente encontradas, envolvo e enlaço.  Para falar directamente, mordo. Ninguém gosta de ser mordido, ser o fruto e respectivo atributo, ou seja, ninguém gosta de ser poesia...


(Cynthia Guimarães Taveira)

sábado, 7 de março de 2015

Na ribeira, junto ao mar

  



Vou por essa ribeira junto aos mares,
e ao lado, pequenos e leves lagos.
Espuma salta sem nada que a guarde,
E do céu é todo o choro que me arde.
 
 
Vou por ela como quem não sabe,
mas sei do vento que nela vai.
Corre em esperança assim à vista,
por mais que saiba o mar atrai
 
 
Aves, pássaros nas margens,
brancos de longa perna descansam
Cores tantas deles, em penas vão...
E num estão todos os que são
 
 
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Dou a volta no ventre
e o céu não chora mais,
fora dele tudo impele
para o dentro que contém.
 
 
Cada gesto cada cor
grita do fundo da vida.
Nunca beijei uma flor,
até hoje, meu amor
 
 
Vi Cristo numa história
e dei por ela aflita,
afinal até na sombra
a luz envolve e agita...
 
 
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Só te poderei falar
desta terra infinita
no dia em que a guardares
na ribeira, junto aos mares
 
 
(Cynthia Guiamrães Taveira)


sexta-feira, 6 de março de 2015

A escuta deles



Como escuta um poeta?
Que tempos percorre e que memórias
Donde reconhece, o espelho o poeta?
De que temas, de que providências
De que solo brotam certas flores?
Não escuta a poesia porque ainda não a há
Não escuta os gestos mudos porque são mudos
Que toque, que subtileza é desvendada?
Como se escuta a virtude de um pássaro?
Pelo piar, pelas asas, pela forma de voar?
Só um poeta escreve os passos de Leonor...
Que crepita no poeta que o faz ver no amor?
Que véus o envolvem depois de nú?

 

(Cynthia Guimarães Taveira)