OS SÍMBOLOS
Os símbolos estão dentro da nossa cabeça. No âmago
deles, como no âmago do jardim, encontra-se a nossa alma, algo de indefinível e
abstracto, uma espécie de éter que capta os quatro elementos e que, com
proporções diferentes, ganha tonalidades, mais terra, mais fogo, mais ar, mais
água. Sem a nossa cabeça, os símbolos são meros pedaços de matéria directamente
ligados ao espírito pelo equilíbrio que proporcionam ao universo. Com o coração
adquirem o vigor com que toldam a alma ou com que a tornam mais transparente
para que o espírito nela possa brilhar com mais ou menos intensidade. Os
intermediários podem ser também obstáculos. As raízes mais profundas podem
tocar a gema mais pura, mas a árvore, frondosa, com folhas, ramos e caminhos,
assemelha-se à alma com quatro estações, quatro elementos em torno dela. Se a
raiz toca a gema, a árvore, no entanto, pode transformar-se em jóia lapidada,
reflectindo todos os pontos cardeais do universo e que são infinitos, como a
esfera possui infinitos raios. Quanto mais perto estamos da visão do jardim
como fonte, mais perto estamos do infinito e do absoluto. No entanto, riste-te
e disseste que estava tudo na nossa cabeça. Primeiro nela, respondi. Mas, a
pouco e pouco, o coração começa a pensar e a tocar as coisas com os seus dedos
que são muito próprios, e a falar antes de tempo e por intuição. E o jardim
começa a agitar-se e as palavras começam, pouco a pouco, a surgir em chamas. Só
elas podem transformar. Guiar-nos no jardim labiríntico. Deus, quando disse aos
homens para guardarem o jardim, não lhes disse o segredo que estava por detrás
desse conselho. Nunca disse para recriarmos o jardim e, no entanto, sabia que o
iríamos fazer, mais tarde ou mais cedo. Que iríamos mudar as plantas de sítio,
que iriamos escolher os locais onde iriam nascer algumas flores; sabia onde
colocaríamos o lago, o caminho de pedras e a sua profundidade derradeira que nos
levava a ver o arco-íris no fim dele, pequeno e encaixado no caminho. Não nos
disse que a par e passo com o facto de sermos guardiões, seríamos, também,
criadores. Que deslocaríamos as sementes, que procuraríamos, ainda no alto da
montanha rude, como rude é este povo no extremo ocidente da Europa, quais as
cores e as formas que melhor combinavam dentro dos pequenos muros erguidos
pedra a pedra com as mãos igualmente rudes, pequenas e sujas de tanto removerem
a terra. Não nos falou dos humores da alma, e do pensamento do coração.
Falou-nos em árvores do bem e do mal e da vida, mas o resto calou e nós
descobrimos como se faz um jardim. Pode ser que seja um novo jardim feito com
elementos antigos feitos por Deus. Não nos disse que as árvores se podiam transformar
em jóias lapidadas como a nossa alma. Calou tudo num segredo infinito e
absoluto. Mas, os nossos dedos, em conjunto com os dedos muito próprios do
coração, tornaram-se em quatro mãos, como as quatro linguagens, fazendo rendas,
abrindo caminhos, erguendo árvores, dispondo as cascatas, chorando os lagos.
Quatro mãos, duas externas e visíveis e duas internas e invisíveis, ligadas ao
alto que Deus calou. E foi assim que nasceu a arte e que os homens, neste
extremo do continente, inventaram um jardim novo. E casas caiadas à beira dos
caminhos de pedra, com lagos nos vales, cascatas nas montanhas, árvores de
frutos, quase jóias nos quintais, e flores, muitas flores, que trocavam com os
vizinhos e que faziam pender dos muros e faziam subir nos canteiros e nos vasos
que os oleiros, também eles com mãos d’arte, faziam pelo dia fora, soltando
palavras de fogo se calhava levarem os vasos ao forno como se fosse pão. Porque
estava tudo na cabeça deles, nos dedos deles e no coração deles. E foram
moldando a alma. E conhecendo os astros.
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