quinta-feira, 3 de junho de 2021
Bullying
O impossível
A pedido de várias famílias aqui deixo a minha opinião, que vale o que vale, ou seja, uma vez diluída na opinião de milhões, vale nada. Ainda assim aqui vai. Há uns anitos, andava eu ainda no carrocel desenfreado da feira e fogueira de vaidades que é o Facebook quando me atrevi a deixar longos comentários sobre a minha opinião acerca do que se deveria fazer com a Educação (leia-se Ensino) no nosso país. Esses comentários foram lidos por alguns professores que logo se apressaram a dizer que tais propostas eram impossíveis de realizar. Anitos mais tarde, alguém me veio dizer que o Ministério da Educação queria rever todo o processo educativo porque, se não o fizesse, a escola acabaria. Na verdade, já quase ninguém quer ser professor. Sofre-se muito. Sofrimento é mesmo o termo. Não faço a mínima ideia se algumas "revisões" do processo educativo que o ministério deseja coincidem com as minhas propostas. As minhas opiniões relativamente a isso, diluíram-se, numa primeira fase, em conjunto com todas as outras, numa espécie de pasta amorfa e inútil e, numa segunda fase, depois da minha saída do Facebook, diluíram-se nos registos kármicos do próprio planeta, num vórtice sem fim, em direcção aos abismos.
Neste momento a polémica é sobre as Redes Sociais e o que pode ou não ser dito nas mesmas. Para as famílias que mostraram o desejo de saber a minha opinião, aqui vai: Acabem-se com as redes sociais. Tive a ousadia de dizer isto em voz alta e logo levei o tabefe: "Ah! Então, tu pensas que para se acabar com o bulling (maus tratos, em português), deveriam acabar com as escolas." Respondi que não, que o Facebook não era uma escola de coisa nenhuma. É um local virtual para onde se despejam opiniões, estilo vómito compulsivo. Apenas isso. Já fui viciada nisso, já saí dessa dependência, já fiz o desmame e encontro-me bem, muito obrigada. Comparar o Facebook à Escola é de quem tende a confundir a Sociedade inteira com o Facebook. Não é verdade. A sociedade pode viver sem o Facebook já o contrário, não acontece. E quem diz Facebook, diz qualquer outra rede social. O cinema tem o seu papel na formatação de cabeças, tal como o Facebook, mas tem uma pequena e fundamental diferença: permite que a Arte Aconteça ou possa acontecer. O Facebook é sempre uma imagem rarefeita de tentativas falhadas disto e daquilo, inclusivamente da arte. Não há Arte nenhuma no Facebook. Há uma imitação vazia dela (quando há...). A escrita pode aparecer em qualquer lugar, até na areia molhada, escrita com um pau que a onda há-de levar. Um post sobre Klint não é arte porque não é a feitura da obra, apenas a observação dela, e nem sequer ao vivo é... dito isto, chamem-me as várias famílias o que quiserem. A opinião delas sobre a minha opinião é tão válida como a minha e no vazio se esvai e evidentemente que muitas opiniões acham "impossível" o término das redes sociais. No entanto, a minha consciência está tranquila. O dessossego está sempre cá, porque a minha alma é artística. Isto para as famílias que confundem "dessossego" com "consciência": as duas querem-se como vieram ao mundo, uma naturalmente desassossegada, outra, naturalmente tranquila. Muito boa tarde.
segunda-feira, 31 de maio de 2021
Questões
Deixo para os peritos a interpretação de mais um sonho que tive com o Estado Islâmico. Volta e meia, tenho um mau sonho com este bando de assassinos. Desta vez a acção situava-se na escolha entre o campo/natureza e a cidade para que conseguíssemos escapar ao seu ataque. No sonho, e em jeito de resumo, parecia-me muito mais seguro ficar no campo do que na cidade porque nela não tínhamos como nos escapar das milícias armadas. Os especialistas que interpretem como quiserem.
O portento dos sonhos e da forma como, por vezes, nos surgem como avisos, lembra-me a capacidade que temos de contornar a forma como percepcionamos o tempo. Todos os tempos nos são próximos, todos nos são chegados. Para mim, isso é indiscutível devido à quantidade de vezes que ao longo da minha vida vi os tempos fundirem-se num só.
A consciência, quando se expande, parece querer atravessar este universo e ir para um outro, no entanto, para o fazer, parece ter como condição primeira, o abarcar deste universo inteiro. É nesses momentos que tudo nos aparece interligado e tudo existe em simultâneo.
Nada do que escrevo é novo, nem superior, nem inferior. É o que é. No mundo esotérico português, tais sonhos são amplificados, extrapolados, exagerados e convertidos em alvos de atenções e comentários. A distancia entre mim e esse mundo actual é cada vez maior. Não me revejo nos protagonistas e nos actores secundários desse meio cada vez mais poluído por pessoas incultas, ambiciosas e malucas. No mundo prático este tipo de sonho deve ser tomado em conta, mesmo sendo sonhos, por gente que, apesar de tudo e das suas fracas capacidades de entendimento de um qualquer plano metafísico e de uma qualquer perspectiva que não seja a corporal, ainda assim e como estão ligadas a esta realidade, podem levar em conta alguma voz que avise.
Escrevo apenas por descargo de consciência e sei que quem lê este blogue com olhos de ler e não à procura de uma qualquer falha ou virtude de quem o escreve, também o faz por uma questão de consciência.
domingo, 30 de maio de 2021
O estranho ritual da saída da gruta
Ando a conviver em salas de aula com crianças de doze anos, o número das badaladas do meio-dia e da meia-noite. A matéria que me coube leccionar foi a dos Descobrimentos, palavra que agora o Ministério por pudor, ignorância e sobretudo por aderir à contra-iniciação sem se questionar, substituiu por "Expansão Marítima". Enquanto a pide de esquerda não for à minha sala de aula, a palavra "Descobrimentos" ou "Descobertas" continua a ser proferida até porque, não nos limitámos a expandirmo-nos, fomos além disso e descobrimos muitas coisas. Falava eu dos contactos com outros povos e do que tínhamos aprendido com eles e de como a riqueza deles nos tinha enriquecido a nós quando um aluno hiperactivo me abordou questionando-me: 'E Portugal? O que é que Portugal lhe deu a si, professora? Reparei que a criança num microsegundo me tinha confundido com Portugal o que penso ser muito natural, e respondi-lhe: "O sonho e a poesia, coisas muito importantes". Rápido, o aluno acrescentou: "É verdade, somos um país de sonhadores e de poetas". E nesse instante, um estranho silêncio caiu naquela turma, e todos nós, movendo-nos nesse estranho silêncio, saímos da gruta e vimos surgir à nossa frente o Mar imenso. Este ritual português nunca foi escrito, os seus gestos nunca estiveram gravados e a sua dança nunca foi uma coreografia pré-definida. Ele acontece simplesmente ao longo das Eras. O grande silêncio da consciência de quem somos e de como somos. Ele acontece sem antes nem depois. O tempo pára na profundidade dos seres, a saída da gruta é solene. O mar brilha à nossa frente e a barca do sonho eleva-se até à grande poesia que existe só depois de se ler um poema, só depois de nos lermos a nós. Onde quer que seja, nem que seja com crianças de doze anos, todos juntos, a nascer de novo.
domingo, 23 de maio de 2021
As banalizações
sexta-feira, 14 de maio de 2021
A Guerra dos Silêncios
terça-feira, 4 de maio de 2021
Optimistas e Pessimistas
Como as coisas me incomodam. Imagino a Casa da Índia com os seus afazeres, ela própria um entreposto comercial. Mas as multinacionais nada têm a ver com isso. São pequenos impérios com propósitos sinistros que tornam as pessoas autómatos de vendas, de números, de especulações. Desumanizam e segregam. Há uma espécie de optimistas em número crescente. São aqueles que dizem que o mundo está perdido, que não há esperança para ele, mas que, relativamente à sua vida pessoal, têm sempre esperança de que as coisas vão melhorar. Isto só é possível com uma espécie de corte entre eles e o mundo. São filhos únicos do mundo. Depois, há os segregados que pensam que o mundo poderá vir a melhorar, apesar de, na sua vida, a esperança ser um resíduo perdido como a cauda de um cometa já de brilho ténue na imensa solidão do cosmos. Esses, inscrevem-se numa espécie em extinção daquilo a que se pode chamar uma semi-vocação: os mártires. E nenhuma destas espécies de optimistas parece sobreviver durante muito tempo. Mais tarde ou mais cedo, uma espécie converte-se noutra e vice-versa. O optimismo, sempre a par com o pessimismo de qualquer feitio, tornou-se numa doença bipolar e o entusiasmo perde-se, como uma festa que esmorece. Tornar vivas as coisas, independentemente do optimismo e do pessimismo, parece tarefa quase impossível. O mundo, aglutinado em duas espécies de massas, as das multinacionais e a dos desvalidos delas, refugiados em terrenos ideológicos de esquerda que vivem dos oprimidos (que se deixaram na maioria das vezes oprimir a troco de conforto e das promessas de felicidade, tanto da publicidade como da propaganda política), dão cabo do ambiente. Tanto do ambiente que nos cerca, cada vez mais poluído, como do ambiente propicio à vitalidade alegre de se estar vivo. O mundo torna-se num campo de batalha com a desvantagem de estar, não apenas num determinado terreno, o de guerra, mas em todo o ambiente que nos rodeia. As relações humanas são cada vez mais bélicas com sentimentalismo fácil à mistura. E enjoa como uma pastilha elástica velha. E tudo porque nada, absolutamente nada é feito à escala humana. Nem os edifícios, nem as pessoas. Babel, à medida que cresce em altura, baralha a comunicação entre os seres. Parece uma consequência natural. A grandeza externa do mundo dos negócios conduz à grandeza externa das massas de segregados e a única linguagem que existe em comum, quando há falta de capacidade de se comunicar, é a das armas. A guerra, já nem sequer possui o valor simbólico que um relativo aumento de consciência lhe proporcionou: a interna, entre a besta e o homem. A comunicação torna-se em agressão à medida que desaparece. De maneira que vivemos num mundo extremamente agressivo e bélico, em que as relações são sobretudo de poder, a melhor expressão da torre de Babel, mesmo que todos falem inglês e entendam o filme do mundo sem legendas. E daí que a maioria dos textos acabem por se parecer com diários de tempos de guerra, pontuados com os seus devidos romances, sempre redentores no seu sentimentalismo barato, de lágrima fácil ao canto do olho, que vai redimindo os cronistas, aplaudidos histericamente pelas massas que ecoam nas redes sociais. A escala humana das acções, dos produtos, dos projectos humanos é aquilo que nos dá o ambiente propício à boa lembrança. O ambiente feliz é aquele que é bem recordado, mais até do que aquele do qual temos consciência enquanto estamos nele. Tudo aquilo que é desmesuradamente grande ou desmesuradamente pequeno, torna-se numa má recordação. Daí que ainda recordemos Babel ou as mesquinhas acções que conduziram à crucificação de Cristo, com um sabor amargo na boca. A escala humana é mais complexa do que parece porque vem incluída com o prato predileto da divindade: o facto de fazermos a ligação entre o céu e a terra. Nem tão grande como o céu, nem tão pequeno como a terra. Somos aquele ponto em que as linhas paralelas se tocam e isso só é possível com uma determinada vibração do coração. Quando é possível, o coração vibra de felicidade ou de alegria, como lhe queiram chamar, os anjos rejubilam, os outros tornam-se irmãos e mais tarde, a recordação é boa. O ambiente é bom, as crónicas de guerra transformam-se em poesia e é nessa altura que a língua portuguesa intervém imediatamente porque está no seu ambiente, sendo que a poesia é muito mais do que a transformação dos escombros da guerra em ruínas românticas propícias a nostalgias de adolescentes… a poesia é bastante mais do que isso, é o brilho externo da ponte entre o céu e a terra, só possível, quando a escala é humana e o homem adulto readquire a sua primordial idade, com uma ligeira, mas muito qualitativa diferença da chamada infância, já não como recordação distante e nostálgica mas como vivência. Até que isto seja compreendido e alcançado, só temos ambientes tensos e frustrantes e a terra toda, o planeta todo, que é um ser vivo, não é indiferente a tais ambientes… e responde com a mesma linguagem porque é aquilo que escuta e recebe dos intermediários humanos, oscilantes, na contemporaneidade, entre o macro e micro optimismo e pessimismo, desproporcionais relativamente à razão pela qual existimos.