sábado, 19 de dezembro de 2015

Naufrágio Português



Somos a réstia de um povo
que das memórias só resta
a mais triste delas sem remorso
e nem essa nos serve para mestra...
 
De modéstias falsas e verdadeiras
no ocaso de nós em deserto errámos...
Arde o sol como um rei e dele não sei
se são só histórias breves e derradeiras...
 
Se elevado o sol assim foi feito
para de nós estar sempre apartado
escreve-se hoje a poesia de tudo
e do que tem de profético e de zangado...
 
Sou herdeira de poetas
não das suas palavras que não as tenho
mas dessas lágrimas sem fim
de que Portugal se vai julgando...
 
Fomos separados de nós
há quatrocentos anos e tais,
tão longe ficou essa voz,
só memória e pouco mais
 
Ficámos filósofos e poetas,
às vezes pontuados de brilho,
mas até esses já levantam
todas as armas sem sentido...
 
Resta-nos este choro cantado
por Bandarra em fim de trovas
e ninguém se rebela contra o fado
de tais lamentos que são só amarras...
 
Arte breve seria poder
trazer de volta a raiz
antes de este ter de ser
a rosa aberta a meia-cruz
 
Ninguém se rebela porém
e cheios de rimas assim se ficam
mas na volta que Deus impõem
O Mais desse mistério é ser coisa viva...
 
 
(Cynthia Guimarães Taveira)

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