segunda-feira, 22 de maio de 2023

O JARDIM DOS SÍMBOLOS XXXIII

 


MAR

 

O jardim tornava-se labiríntico se os nossos pensamentos o tornassem labiríntico. Nas subidas dos caminhos construídos nas montanhas pelos homens rudes, havia sempre patamares, nos abismos escarpados das montanhas, nunca os havia. Todos os patamares eram ascensões, mesmo que ficassem a meio das descidas… os patamares obrigam à contemplação, à espera, à recuperação, pequenos mares. Os deuses, quando caíam, voavam e quando voavam jamais poderiam cair. Souberam disso os homens e mulheres, descendo pelos caminhos em direcção ao mar, quando a ele regressaram e, por esse caminho que os levava ao grande oceano, foram plantando jardins onde as plantas fixavam as suas raízes e onde algumas se transformavam em aves que, serenamente, a certas horas do dia, se deixavam ficar a contemplar o mar  e que, noutras horas do dia , recolhiam os seus frutos marítimos que são sempre mares eles próprios, para outros frutos. Todos os peixes do oceano guardam em si o milagre da sua própria multiplicação. Todo o oceano é multiplicável, toda a terra é redutível sem o mar. Iniciaram as viagens da terra para o mar, do céu para a terra, numa nau que era um aparente labirinto movimentado de raízes, jardins e ondas; viagens de naus, terrestres e celestes, entrando pelo mar que esperava por elas, talhadas como ondas de madeira perpendiculares aos mastros que eram as árvores da terra. O oceano brilhava à luz do sol e da noite, um novo jardim com a sua oscilante linha do horizonte, em degraus que desapareciam para outros aparecerem quando se elevava a proa. Só se pode navegar quando esse brilho solar e lunar é captado, sentido, recolhido e desenvolvido. Disso os deuses sabiam e isso esperavam dos homens e das mulheres nascidos das sementes: que regressassem à praia de onde tinham vindo. Esperavam pelas suas naus, pelas suas cordas, pelas suas velas, velando pelo mar e, sobretudo, pelos jardins que levavam com eles para que os plantassem longe como o horizonte, em terras diferentes. Os deuses sempre estiveram em todo o lado. No espaço e o tempo, na imagem que deles fazemos, na origem das palavras que cantamos na solidão das catedrais de pedra, e na imensidão do mar, sem que haja diferença entre a catedral e o mar. Ambos ecoam o que vamos dizendo. A Descoberta é uma oração, a oração uma Descoberta. 

 


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