MAR
O jardim tornava-se labiríntico se os nossos
pensamentos o tornassem labiríntico. Nas subidas dos caminhos construídos nas montanhas
pelos homens rudes, havia sempre patamares, nos abismos escarpados das
montanhas, nunca os havia. Todos os patamares eram ascensões, mesmo que
ficassem a meio das descidas… os patamares obrigam à contemplação, à espera, à
recuperação, pequenos mares. Os deuses, quando caíam, voavam e quando voavam
jamais poderiam cair. Souberam disso os homens e mulheres, descendo pelos
caminhos em direcção ao mar, quando a ele regressaram e, por esse caminho que
os levava ao grande oceano, foram plantando jardins onde as plantas fixavam as
suas raízes e onde algumas se transformavam em aves que, serenamente, a certas
horas do dia, se deixavam ficar a contemplar o mar e que, noutras horas do dia , recolhiam os
seus frutos marítimos que são sempre mares eles próprios, para outros frutos.
Todos os peixes do oceano guardam em si o milagre da sua própria multiplicação.
Todo o oceano é multiplicável, toda a terra é redutível sem o mar. Iniciaram as
viagens da terra para o mar, do céu para a terra, numa nau que era um aparente
labirinto movimentado de raízes, jardins e ondas; viagens de naus, terrestres e
celestes, entrando pelo mar que esperava por elas, talhadas como ondas de
madeira perpendiculares aos mastros que eram as árvores da terra. O oceano
brilhava à luz do sol e da noite, um novo jardim com a sua oscilante linha do
horizonte, em degraus que desapareciam para outros aparecerem quando se elevava
a proa. Só se pode navegar quando esse brilho solar e lunar é captado, sentido,
recolhido e desenvolvido. Disso os deuses sabiam e isso esperavam dos homens e
das mulheres nascidos das sementes: que regressassem à praia de onde tinham
vindo. Esperavam pelas suas naus, pelas suas cordas, pelas suas velas, velando
pelo mar e, sobretudo, pelos jardins que levavam com eles para que os
plantassem longe como o horizonte, em terras diferentes. Os deuses sempre
estiveram em todo o lado. No espaço e o tempo, na imagem que deles fazemos, na
origem das palavras que cantamos na solidão das catedrais de pedra, e na
imensidão do mar, sem que haja diferença entre a catedral e o mar. Ambos ecoam
o que vamos dizendo. A Descoberta é uma oração, a oração uma Descoberta.
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