Não recordo como se tivesse saudades tristes
alguns barcos navegando,
vapores de longos fumos junto às margens,
entre despedidas e festas de longos fatos,
e trajes negros e distintos, charutos e champagne.
Não recordo algumas memórias
como se precissase delas e sem elas não pudesse
achar tudo o que é futuro...
Do que não recordo, mas sei,
disso sim, um barco
de longe vindo,
junto das nuvens e com elas confundido,
de patamares de mármore quente,
de uma claridade consciente,
e essa temperatura mais doce que morna,
que não recordando amei.
Guardo impressões do mundo,
como se por aqui tivesse passado,
em passeios de tempo e campo,
em histórias colhidas num jardim de jasmim
e, só por isso, ao vê-lo nascer na calçada
recordo não serem ramos de alecrim,
estes que vejo aqui, e as flores, essas
possam ser canções que canto de cor,
estes que vejo aqui, e as flores, essas
possam ser canções que canto de cor,
quando perante o vento se inclinam, ainda assim...
(Todo o mundo é um cenário que vivi,
mudando a cena para outras de outra vida.
Quem sabe cenários de um amor sem fim...?)
Mas nada disso entra por esse outro de mim,
que de longe parece guardar um eco d’outro passado
dizendo-me em Saudade o que sei e onde nunca estive...
Entre o que recordo e o que sei,
há uma infinita ponte erguida no vento,
toldada pela neblina da eternidade,
brilha vagamente sem lembrar ser o que é:
esse estar dentro do abraço num certo tempo,
a festa, girando por entre os sóis, debruada a dança,
a lua aplaudindo quase silenciosa esse outro tempo,
e dele sabe, e dele não se lembra e dele não se cansa.
(Cynthia Guimarães Taveira)
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