Ver-te assim, quase como se não quisesse ver-te assim,
impressiona-me o teu choro final. Não viste e tudo viste. Não sentiste e tudo
sentiste. Portugal não morre porque reencarna, neste e naquele, e com este e
aquele vai dizendo, ou com todos os outros que se lhe aproximam vão dizendo.
Corpo sem alma nem corpo é... pó estrelar e pouco mais... toda a substância se
une em ti. Único em voz e em esperança. Que posso dizer ou fazer sendo o país
assim? Irregular e indeciso, branca de neve adormecida em castelo e caixão,
qual deles de cristal, qual deles prisão? Consegui um monte que é um vale e um
vale que é um monte. Que mais posso fazer desta torre que de tudo me cerca?
Todos são parte de um poema já escrito. Reconheço todos os passos e todos eles
em mim. Quase em tédio me envolvo se os leio dentro, fora de mim e ainda em
outros traços... Deste-me uma folha branca, para que acabasse o poema que
iniciaste... e agora que passos darei, que deuses evocarei, que sorte ou
perdição esperam tudo o quanto ainda não sei? Não, nada se repete e, no
entanto, tudo surge igualmente mas transformado e, transformado, pode ser diferente, e transformado pode ser concreto. Sei que queres o milagre de um poema
acabado... sei que queres esse milagre, da luz, das estrelas e de outras
coisas que, ao contrário, não vi... mas se não vi? Sou a memória viva dos poetas e nem
escrever os sei, apenas vivê-los por onde ninguém os vive. Sou apenas a sua memória dos seus passos... e que são passos. Para que serve uma memória? Para que serve para que
sirva?
(Cynthia Guimarães Taveira)
Sem comentários:
Enviar um comentário