sábado, 13 de junho de 2020
O grande mar
Os loucos de hoje são os tontos de ontem. Já não há espírito caridoso que aguente. Para que serve ter interlocutores ou tontos ou loucos, se a única coisa que se pode fazer é ficar em silêncio e aguentar firmemente o monólogo onde navegam? Quem me dera ter a sorte de gente sólida. E poder não guardar a inteligência que, exposta, nem se vê. Hoje faz anos o meu amor Fernando Pessoa. Ontem fez anos o único, que em anos, manteve um diálogo comigo rico, mágico, pleno e criativo como um ovo cheio de gema a germinar a verdade. Sim, a verdade. Ainda assim, tive sorte. Mas depois. Depois vem uma solidão profunda de surdos e mudos. E cegos. Tento colocar um véu de novo, entre mim e o mundo. Mas não consigo. É impossível. Aparece-me o mundo tal qual como é. Custa-me a caridade por a achar um imbecil remendo. Coisa de pouca dura. Preciso de generosidade como de pão para a boca. Mas só aqueles, que mantêm um diálogo rico, mágico, pleno e criativo podem ser generosos. Só com eles posso ser também. Com os restantes arrasto as grilhetas da caridade pesadas e imbecis que não ensinam ninguém a pescar. Porque nem um nível de interpretação acertada conseguem ter. A caridade é um atraso de vida. A generosidade, um avanço na vida. Canso-me da fome. Da minha própria fome. Os outros só a têm por batatas-fritas Pala-Pala, com um prazo de validade estendido no tempo, mas sem a frescura saudável de um fruto acabado de colher. Oh, Deus! Dou por mim a falar com o mar porque a sua música, pelo menos, parece responder-me. E vejo a ilha lá longe, tão próxima de mim. Saudades de quem fala e me fala ao ouvido e a quem respondo como se fosse um grande mar a quem é impossível parar de ondear para que alguém navegue nele, distante de mim, e contente por ter a onde ir.
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