sábado, 5 de junho de 2021

A estupidez





A democracia vestiu-os a todos com as cores políticas e colocou-lhes umas lentes através das quais só conseguem ver o mundo a preto e branco. Aos mais bravos, colocaram uma lentes ou pretas ou brancas, de maneira que nem os contornos chegam a ver. É certo e sabido que os arquitectos neste país andam a fazer casas compulsivamente pintadas de preto, cinzento, branco e vermelho. Estão a preparar o terreno para a guerra. É vê-las nascerem como flores selvagens na paisagem campestre. Um bom indício do que se passa. Pensávamos nós que estas novas vestimentas, acompanhadas pelas devidas lentes com que se enxerga o mundo, fossem apenas para a arraia miúda que acredita em tudo aquilo que ouve, mas nem nos tínhamos dado conta, que essa arraia, já há muito estava a invadir os supermercados e tinha comprado romances de mistérios históricos inspirados em chaves do areeiro esotéricas, e que essa mesma arraia, tinha invadido as palestras e publicações e que andava agora nessa roda viva, a fazer ela mesma, livros e palestras de encantamento das massas. Posto isto, é notícia, que toda a sociedade, se vestiu com os tons com que os arquitectos pintam as casas horribilis e se pavoneiam com a última verdade-exclusiva que conseguiram pescar na Internet. Mas não são apenas estes novos-ricos-do-esoterismo-e-da-cultura a fazerem o seu passeio diário e higiénico, prolongado no tempo e na avenida, com o seu mais recente caniche, ora preto, ora branco, emproado e de penteado mantido a laca-viral-chinesa-que-a-culpa-é dos-amarelos-que nos deixaram-a-preto-e-branco [sic pela metade da boca de uma aluna de 12 anos entontecida pelas observações do pai-arraia-miúda-a-comentar-o-jornal-da-hora-de-jantar], também os da velha guarda não resistem ao desfile, esses, acompanhados por galgos à procura de vítimas na sua caçada que já vai longa, de troféus que os hão-de levar às portas do céu que é puro e sem gays, nem mulheres que não sejam virgens, tal qual o seu ini-amigo muçulmano. Quer de um lado, quer do outro, fazem a vontade ao clima cinzento da antiga União Soviética e da Alemanha Nazi. Spielberg, na lista de Shindler, acertou em cheio nas cores, filme a preto e branco, apenas pontuado por um apontamento de um vermelho mortiço, indicativo do sangue e da tragédia. A insensibilidade estética é sempre um indício de que as coisas não correm bem. Olhamos para isto e cultivamos flores para que a alma não se conspurque no pantanal sem conversa possível que nos cerca. E vamos encenando a nossa ditadura pessoal, feita para nós, alta-costura de um único cliente, e vestimo-nos de flores, de dourados, de prateados, de almas mais próximas dos anjos e deixamos o lixo ao que é do lixo. As nossas lentes são outras, e sempre foram e nunca pensámos que o mundo chegasse a isto. Pelo menos tão depressa. E que fazer senão admitir que a vida é breve mas não a estupidez?

Sem comentários:

Enviar um comentário