quarta-feira, 2 de janeiro de 2019
A História do Estilo
Nunca me preocupei com o estilo. Já nasci com ele. Nunca fiz "experimentações" visuais. Já nasci com um mundo interno intacto. Aquilo que sempre senti foi a urgência de desenhar e pintar esse mundo. Do estilo, não queria saber. Nem nunca me interessou. Era mais essa pressa que me alinhava com o papel. O "vou fazer" sobrepunha-se a tudo. O meu mundo é simbólico porque sou uma alma antiga.
No outro dia fui ao Teatro. Pela noite de Lisboa, na sua baixa, havia imensas lojas abertas que desconhecia porque hoje sou saloia com gosto e honra. Cada uma tinha o seu estilo, o seu modo de comunicar, sobretudo com os turistas. Havia uma espécie de "standartização" do estilo. Uma espécie de obrigação em se ter imaginação. Excepto numa única loja na qual entrei por ser diferente, para além de ter estilo. Lá dentro estava um cão num tapete. O verdadeiro estilo, tido sem querer. A dona da loja chamou pelo seu cão: "Camões!". Tinha entrado na loja certa. Camões nunca se preocupou com o estilo. preocupou-se apenas com a forma: um soneto, por exemplo, que é difícil de fazer. O estilo saía-lhe naturalmente, como quem não quer a coisa e não queria, de facto. O seu estilo não era apenas a forma de olhar. Era, evidentemente, como uma evidência, aquilo que via... Porque sabia ver o mundo interior no mundo exterior.
Nunca me preocupei com o estilo, nem com experiências ou experimentações. O mundo interior corre como tem de correr, intacto e igual a si próprio.
Não há volta a dar para uma alma antiga. A minha liberdade interna não se adapta a esta liberdade externa da "experimentação" (a experiência de que fala Camões nada tem a ver com a "experimentação"), da "procura de um estilo". O que se deve procurar é um mundo interior, mas esse também não se procura. Encontra-se lá, como quem não quer a coisa. E não se quer, de facto. Dai que não seja comercial nem esteja à venda para turistas... Como o cão chamado Camões na loja não o estava. A loja mais bonita da baixa. A única na qual entrei. Tinha alma e um psicopompo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário