O "y" para além de ser uma letra divina é também uma letra simbólica. O ramo da árvore que se subdivide. A centelha divina nos seres.
No filme "O piano", lindíssimo, esse "y" aparece no solo como trilho e é na escolha de um dos lados da divisão que está todo o desenrolar da história que se segue.
A aceitação de uma centelha divina nos seres fica ao critério de cada um. Uns vivem bem sem isso, outros vivem bem com isso. Na verdade isso não é importante e é muito importante. Ou antes, torna-se importante em certos solos que se bifurcam. Nessas alturas, o "Y" aparece incandescente dentro e fora de nós.
Há uns anos deu-se um desses "Y" à entrada de um Centro Comercial. Bizarro acontecimento que me fez, minutos mais tarde, tomar uma decisão, desta vez numa rotunda, numa circunferência.
A decisão tomada implicava ou dinheiro e liberdade convencional, ou uma autêntica incógnita. Foi um símbolo, um símbolo estranho, um objecto que serviu de símbolo, na altura, nomeadamente um chocolate que me fez decidir pela incógnita. Um verdadeiro salto no abismo.
Poderia ter ficado por aquilo que já conhecia e não escolher nada, poderia ter ficado com o dinheiro e a suposta liberdade ou poderia ficar com a incógnita (na verdade a letra "y" tem três trilhos se bem analisada... ) mas preferi a incógnita. No fundo preferi saber mais. E não foi uma má escolha. Quando nos resignamos a não saber mais, os caminhos prosseguem mas não são tão ricos. Uma das coisas que aprendi é a diferença que existe entre as pessoas interessantes e as interessadas. As interessantes, de alguma forma, já meteram na cabeça duas coisas: que já sabem bastante e que há coisas que nunca vão saber. As interessadas, por seu lado, são um pouco doidas porque não meteram ainda nada na cabeça: nem que já sabem umas coisas nem que há coisas que nunca vão saber. Não são pessoas interessantes, mas são pessoas extremamente vivas. Em todos os planos. Possuem uma centelha divina visível entre pares. Essa é uma diferença fundamental.
Só um artista muito inteligente consegue compreender que existem três vias no Y.
ResponderEliminarDevo acrescentar que a bifurcação são as escolhas e que o terceiro trilho que fica para trás é a capacidade de olhar para o caminho percorrido com outros olhos caso se escolha bem na bifurcação. Esse terceiro trilho que fica para trás é a capacidade de ver o passado com olhos novos e esse novo olhar indica que aquilo que dantes não fazia sentido se desvenda com um sentido simbólico. Evidentemente que existe o risco de ficar estagnado nessa perspectiva nova. Fernando Pessoa, sentiu isso muito bem quando projectava o paraíso na sua infância, numa espécie de saudades (e não saudade como repetem os que leram alguma coisa) só que de um paraíso vivido na infância. Esse tipo de erro é muito comum e não tem nada de mal. Chamo-lhe erro porque pode conduzir a uma estagnação. Frequentemente os poetas recordam a infância desse modo. É uma recordação, não é uma reminiscência (são coisas diferentes). Essa capacidade de ver o passado como um trilho já percorrido deve ser visto sempre em termos simbólicos e não com uma visão sentimentalista e lacrimejante. O pendor intelectual da obra de Fernando Pessoa é de tal maneira elevado que compensa em larga medida, essa tendência , no entanto, confundir infância com paraíso é um pouco abusivo para com o paraíso. A inquietude de Pessoa na demanda conduziu-o também à procura de sossego e a única lembrança que tinha dele era o da infância. A paz da sua infância, não a paz profunda que é outra coisa (desce do alto).
ResponderEliminar