quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Fim de tarde


 

Até percorreria todos os ambientes de que me lembro. Bares com bancos altos e pernas cruzadas. Um cigarro, uma boquilha e os espelhos na parede do bar onde espreitam os rostos, os vestidos cor de pérola, os fatos escuros. Como num filme. Sim, como num filme qualquer. Qualquer imagem serve. Uma casa no cimo de uma ligeira elevação no terreno. O verde das ervas e as searas competindo pela fotografia e o sol já do fim da tarde tornando esguias todas as sombras. Ou o gelo por onde vagueia um urso. Qualquer imagem que me sossegue.  E tudo o que escrevo me parece ser menos importante do que aquilo que penso, nos intervalos em que escrevo, enquanto olho pela janela e deixo que os pensamentos fluam como as águas da grande cascata. Este fim de tarde esquecido de si entra pela minha paisagem interior quando não espero. E dentro de mim, as sombras esguias, não são negras, mas possuem um brilho que se distancia do sol. E dançam num outro sistema solar, feito pelos planetas interiores e pelas luas que são pássaros que cantam os sorrisos sortidos e intermitentes do brilho dos planetas.

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