terça-feira, 11 de junho de 2019
Perfis
Se pudesse sentava-me neste monte à espera, como os mestres orientais que nada esperam. Mas não sou mestre nem oriental. Calhou viver no cabo de mim mesmo. A olhar em frente, com cotovelos a mergulhar no mar, o queixo apoiado nas mãos e perfis que são rasgos de uma mesma alma. E nada está quieto. Nem o mar, nem as gaivotas, nem os tesouros do fundo das águas envolvidos por algas. Nem eu, nem o meu olhar, nem o vento que quando está quieto morre.
Gostava de ser mestre para ditar a razão e a falta dela. E de saber que as coisas se mexem só porque olho para elas. Que só existem porque as vejo. Que só retornam porque as encontro. Mas dos mestres e dos orientes guardo apenas um pressentimento, uma ligeira alteração na face de um dos meus perfis. Deixo-me ficar, no outeiro das mil fontes, jorrando palavras como quem não lê. Encosto o vale à montanha, inclina-se para ela pedindo um beijo. E consigo o milagre das mil faces, de ser outeiro e vale, sem que se suba ou se desça. Sem que se seja senhor ou escravo, livre ou pecador, no incessante movimento de tudo ser.
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