sábado, 2 de março de 2019

Tendências


Quando era miúda ofereceram-me um pêndulo de Newton igual a este. Estava numa mesinha da sala. A transferência de energia que percorria as três bolas interiores que permaneciam estáticas a partir do lançamento de uma das bolas da extremidade, fazia com que a outra bola da extremidade fosse lançada para fora do grupo de bolas e que, chegando a um determinado ponto, regressava batendo na bola do conjunto das três estaticas que transferiam, por sua vez, a energia para a bola da ponta fazendo com que ela voltasse a repetir o mesmo comportamento inicial aquando o primeiro lançamento feito por nós. Assim as do centro mantinham-se estáticas sendo o seu papel, apenas, o de transferirem energia.
Para o pêndulo funcionar necessitava de duas energias que andavam em direcções opostas. Sem isso nem o pêndulo servia para nada. Assim vamos nós em Portugal. Pensamos que o poder e a tecnologia, (esta última, mais não é, senão uma forma de poder) são suficientes para colocar o pêndulo (símbolo, entre outras coisas, de movimento (e consequentemente de vida) e de equilíbrio. Mas, assim, o pêndulo não anda. A Arte & a Literatura, as humanísticas, as "humanidades", essa coisa da poesia, da filosofia e outras que, naturalmente, se lhes seguem, e que não pertencem ao domínio do binómio poder/tecnologia que parece fascinar, não só as novas gerações como as antigas e muito ciosas do vinte e cinco de Abril onde fizeram questão de estar, é o outro lado da questão e é o lado que mais perto está da terceira força invisível que faz andar o pêndulo verdadeiramente porque na natureza não há nada igual, nem nada que se repita (de maneira que a igualdade das bolas das extremidades é ilusória). Assim, quando vejo esta atracção pelo poder e pela tecnologia fico desconfiada. Nao chega. Porque de nada serve o poder nem a tecnologia se não tivermos pessoas. E as pessoas são formadas por dois terços de poesia e apenas um terço dessa coisa chamada poder e tecnologia. E daí a proximidade com terceira força que anima a totalidade do pêndulo. Porque só a poesia a pode saber e conhecer. Aquilo que mais atrai o país será aquilo para aquilo mais tende. E a terra parece ser muito mais atraente do que o céu que é muito maior. Interesses rasteiros geram um país rasteiro. Quando o poder parece ser muito interessante é porque não temos poder nenhum. Quando a poesia, distante da tecnologia, se torna muito interessante, então afinal, até se sabe e se conhece o que é que verdadeiramente produz a oscilação do pêndulo. Digamos que os que se interessam muito pelo poder e pela tecnologia contribuem em apenas um terço para a vida do país mas, como têm uma tendência para o poder, julgam contribuir os tais dois terços. Um país desequilibrado é assim. E assim nunca se encontra. Nem sai do Inferno. E tomam, esses, as palavras de Dante como verdadeiras, mais cedo ou mais tarde, quando diz que se perde toda a esperança de sair do Inferno quando no Inferno se entra. É aliás, muito italiano... Muito católico, o caldeirão a arder eternamente. Mas o nosso poeta é outro. É Camões. Muito mais nosso. Muito de acordo com o nosso centro. Muito de acordo com o ritmo da nossa respiração que tende para a Liberdade.

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